
Presencialmente, pelas redes sociais, por e-mail ou pelo whatsapp… As reclamações sobre o atendimento precário prestado na UPA Central terceirizada chegam por vários os canais até o site Ataque aos Cofres Públicos, que desde setembro está fazendo uma ouvidoria popular junto aos pacientes.
As pessoas relatam situações que variam de mau atendimento a descaso e não ganham nenhum tipo de “caixinha” para falar. Os depoimentos são voluntários e carregados de indignação.
Ciente da realidade que desmascara dia a dia o discurso da “excelência através da gestão compartilhada com OSs”, a Prefeitura agora utiliza-se da máquina pública e da imprensa para construir a seguinte narrativa aos munícipes: “A culpa da UPA estar superlotada é da população, que não sabe usar o serviço”. No Diário Oficial e nos jornais da Cidade o secretário Marcos Calvo aparece para justificar o injustificável.
Um golpe mais do que baixo! Calvo cita que uma dor nas costas, por exemplo, deve ser tratada nas unidades básicas. Por esse raciocínio, o paciente que procura a UPA para se livrar da dor colabora para lotar a unidade. Mas o secretário não diz que nas policlínicas a espera para marcar uma consulta é de meses. Há especialidades em algumas unidades com agendamento superior a seis meses!
Ora, se o cidadão que está com dor e precisa de um médico não consegue acessar a rede básica, ele deve aguentar as dores por semanas ou meses para não sobrecarregar o serviço?
Outro golpe baixo do governo é “trabalhar” os dados conforme sua própria conveniência. Quando é para definir as metas quantitativas de consultas a serem cumpridas pela Fundação do ABC a administração considera apenas clínico geral, pediatria e ortopedia. Quando é para mostrar na imprensa como o atendimento cresceu de forma “inesperada” infla os dados incluindo os atendimentos odontológicos na conta.
A população não têm instrumentos para interpretar a maquiagem nos números, mas sabe muito bem o que é ser tratada com descaso. Os pacientes sabem que faltam médicos e funcionários na unidade e que essa é real causa das enormes filas. Enquanto isso, os repasses mensais à empresa que gerencia esse caos estão em dia. Por ano, R$ 19,1 milhões.
Sheila Olave é uma das que se queixam. Pelo facebook ela conta que a UPA não tem cadeira de rodas e, mesmo que tivesse, as cadeiras não entram na sala de triagem e atendimento. “Os cadeirantes precisam ser carregados para dentro da sala!!! Absurdo!!!”.
E segue desabafando: “Primeira vez que fui nessa Upa Central cheguei às 14h30 e consegui ser medicada às 20h. Vi dois cadeirantes serem carregados e muitas pessoas passando mal, se arrastando das cadeiras. É bizarro”.
Na última segunda-feira (7), durante a Ouvidoria Popular, nos deparamos com o caso do estivador Júlio Mateus Leite Neto. Ele e a esposa se acidentaram de moto e chegaram na UPA meio-dia, em viatura dos bombeiros. Por volta das 15 horas, desistiram de ser atendidos e foram embora com diversas escoriações e hematomas. “Não tem ortopedista. Ele foi almoçar e não avisou ninguém. Também não tem radiologista. Estava na maca até agora. Estou saindo com dor no peito e vou para a Santa Casa. Isso é um matadouro”.
Maria Cristina Pereira, dona de casa, também desistiu de esperar. Ela chegou com o filho e o afilhado às 10h40 e após quase cinco horas no local perdeu a paciência na fila enorme para a medicação.
“Meu filho caiu de um telhado e está com a coluna doendo. Tá inchado eles falam que não é nada. Passaram remédio, mas não tem aqui e eu não tenho condições. Meu afilhado está vomitando, com febre, e dizem que não é nada. Mandaram para injeção, mas tem muita gente. Eles estão com fome, sem comer nada nessas cinco horas. A gente vem porque precisa. Na policlínica demora três meses para passar no médico”.
A atendente Janaína Barbosa, também saiu insatisfeita. “Está uma porcaria. Crianças misturadas com adultos. Não tem medicação. Minha filha precisava fazer inalação e não tem. Estou indo para outro hospital”.
Com a palavra, os pacientes:
Mariana Leite, vendedora
“Alegam que não têm Nimesulida, amoxicilina, xarope e nem dipirona, que é simples, e que toda unidade tem que ter. Está deixando a desejar. Tem gente que chegou às 10h e até agora, três da tarde, não foi atendida. Outro dia eu vim passar na ortopedia e fiquei 4 horas para ser atendida. Ninguém vem no médico para passear né?”.
Maria José Gonçalves de Santana, diarista
“Cheguei meio-dia e meia. Até agora, 15h25, eu não fui atendida. Estou com minha garganta cheia de pus. Tem gente que chegou às 10 horas e não foi chamada. Vi uma médica tratar mal um paciente, empurrando.
E o prefeito de Santos ainda fala que a UPA é uma maravilha. Ele que venha aqui disfarçado e espere pra ver.
Eu tenho mais o que fazer. Não estou atrás de atestado porque trabalho por minha conta. Vim porque preciso de atendimento e estou sendo maltratada”.
Adelcio Jeremias, eletricista
“Cheguei 0h30, por causa de um sangramento e presenciei uma médica maltratando as pessoas. Uma senhora de 64 anos está lá dentro sendo maltratada por ela. Agora no retorno, o enfermeiro me levou até essa doutora, que chama Melissa, e ela não quis me atender porque falou que não era com ela. Pegou o papel, levantou da mesa, entregou e xingou também o enfermeiro. Nesse momento, chegou a senhora e a doutora disse com grosseria: ‘se você não levar o papel na minha sala não vou entender nada’. Eu reclamei e ela disse ‘se vocês quiserem reclamar vão lá na Prefeitura’.
É o caos aí dentro. O prédio está bonito, mas o funcionamento está péssimo. Vim buscar o resultado do exame no horário marcado e não estava pronto.
Onde foi parar o dinheiro do povo? Não tem remédio. Captopril, por exemplo, vou ter que comprar.”.
Cláudia Viana, auxiliar administrativo
“Semana passada estive aqui para tomar medicação porque estou com hemorragia. Na hora da enfermeira tirar a agulha, por inabilidade saiu um esguicho de sangue. Ela não tinha preparo nenhum. Pegou um pedaço de algodão que não estancou o sangue, mandou dobrar o braço e ir embora. Ao virar o corredor esguichou mais e fiquei lavada. Tive que voltar correndo e mostrei para ela. Ela disse ‘problema seu, você lave se quiser’. E saiu andando.
Voltei hoje porque a medicação não surtiu efeito. O atendimento é precário, demora bastante. Cheguei com hemorragia e estava com a mesma classificação de quem estava com dor de cabeça. Os médicos e enfermeiros são mal preparados. Medicação muitas vezes não tem. O prefeito fala que tá bom, mas só pra ele. Ninguém vem enfrentar fila sem precisar”.
Andreza Lopes dos Santos, cozinheira
“Meu esposo teve uma distensão na perna. A gente está precisando de ortopedista e só tem um. Um hospital deste tamanho, dessa capacidade, você ter um médico só para atender é um absurdo. Se está com gente morrendo lá na emergência, o restante dos pacientes fica morrendo onde estão esperando. É dinheiro público, é nosso. Então a gente tem que ser bem atendido. É uma falta de respeito com o ser humano. Ninguém vem aqui porque está brincando. Não tem nem lugar pra sentar”.