No último dia 2, ocorreu em Cubatão uma reunião entre Conselho Municipal de Saúde, usuários do SUS e a Fundação São Francisco Xavier. Em pauta o balanço do atendimento nos primeiros quatro meses da gestão do Hospital Municipal.
Foi o primeiro encontro aberto depois que o equipamento foi reativado, já sob o comando da entidade ligada à Usiminas, e com apenas 60% dos leitos destinados aos usuários do SUS.
A dinâmica da reunião seguiu o roteiro costumeiro das prestações de contas de contratos de gestão em serviços públicos: enquanto um dos lados apresenta planilhas com números, o outro lado contrapõe as estatísticas com muitas queixas e relatos de experiências desagradáveis.
O lado que representa a entidade privada fez uma breve apresentação com índices de produtividade do hospital atualizados até o fim de fevereiro. Como até hoje nem a Prefeitura, nem o Conselho de Saúde e nem a própria Fundação tornaram público o plano operativo do contrato de gestão, não temos como interpretar os dados com profundidade para saber se as metas contratuais estão sendo cumpridas.
O que os participantes escutaram do superintendente da Fundação, Abner Moreira, foram superficialidades. Alguns indicadores se mostraram satisfatórios e outros ainda não estão dentro do ideal, devido à “fase inicial do trabalho”.
O Ataque aos Cofres Públicos solicitou os dados apresentados na reunião para a OS. No entanto, apesar de Moreira ter frisado que os dados poderiam ser acessados por qualquer pessoa que manifestasse interesse, a assessoria de imprensa não nos enviou o conteúdo. Primeiro disse que enviaria parte do material, pois não estava autorizada a enviar a íntegra. Depois não respondeu mais aos nossos contatos.
Diante disso, vamos nos ater aos relatos dos usuários que se manifestaram no encontro. Boa parte dos presentes quis saber porque é tão difícil o encaminhamento de pacientes atendidos nos prontos socorros para o Hospital. Uma munícipe que se identificou como Márcia contou que seu pai, de 84 anos, foi atendido no último feriado no PS Central com princípio de infarto. O médico fez eletro, tirou Raio X e disse que estava solicitando a vaga para que ele fosse atendido na cardiologia do hospital. Mas não foi o que aconteceu.
“O exame deu alteração, mas meu pai não conseguiu a vaga. Passou três dias no PS. Alegaram dificuldades para encontrar um cardiologista por ser um feriado de Páscoa. Ele é um idoso e foi mandado para casa quando deveria ser internado para acompanhamento especializado”, contou.
O representante do Hospital justificou que seria preciso saber mais detalhes sobre o caso para dar um parecer preciso.
Os presentes na reunião também questionaram o fato do Hospital ter suas portas abertas ao SUS apenas parcialmente. “Meu pai contribuiu para a construção deste hospital. Tenho até hoje os carnês. Muita gente pagou também. Esse hospital é nosso. Se está recebendo recursos do tesouro municipal, por que só podemos usar uma parte?”, perguntou uma liderança comunitária.
O superintendente rebateu, dizendo que é preciso buscar a sustentabilidade do serviço, por meio do atendimento via convênios. Ele frisou que as diferenças entre os dois atendimentos são apenas nos aspectos de hotelaria. “Os quartos para os conveniados têm menos camas do que as enfermarias do SUS. Tem também os apartamentos individuais com frigobar. Só isso que muda”.
Até o fim de fevereiro, 392 pacientes foram encaminhados de unidades de emergência de Cubatão para o Hospital. Outros 64 pedidos de vagas foram negadas, segundo Abner por questões técnicas nas solicitações.
Questionado por um dos presentes, o presidente do Conselho de Saúde, Alessandro Donizete de Oliveira, disse que já solicitou à FSFX os dados financeiros sobre os gastos dos repasses municipais mensais destinados à organização social no quadrimestre.
E as metas contratuais?
Como dissemos acima, a maioria dos dados apresentados na reunião não puderam ser comparados com as metas estipuladas no plano operativo do contrato de concessão administrativa de uso de bens públicos, firmado com a Fundação São Francisco Xavier (FSFX).
Esse documento, fundamental para o controle social, até hoje não foi disponibilizado no Portal de Transparência da Prefeitura.
O único documento que consta no site municipal sobre a OS é o extrato do contrato de concessão, com apenas 11 linhas.
De qualquer forma, um dos indicadores que chama a atenção entre os poucos elencados na reunião é a taxa de ocupação do hospitalar, que ficou abaixo do desejado. “Acreditamos que em março já ultrapasse os 83% estipulados em contrato”, disse Abner Moreira.
O investimento da Fundação em novos leitos nos dois andares vazios do prédio, segundo Moreira, só ocorrerá caso se verifique um aumento da demanda por internação por um longo período “A partir do momento em que tivermos série histórica comprovando que a nossa ocupação de leitos está atingindo um nível superior por um longo tempo, podemos abrir mais. Imagino que esse acompanhamento dure pelo menos 12 meses, pois podem acontecer sazonalidades”.
Ao mesmo tempo, no setor de convênios os negócios vão bem. Além de dos trabalhadores da Usiminas, a Fundação passa a receber rendimentos gerados com o convênio assinado com a Caixa de Previdência dos Servidores. São 9 mil mutuários acessando o Hospital de Cubatão, incluindo pronto atendimento 24 horas para clínica médica e cirúrgica, pediatria, obstetrícia e traumatologia, internações normais e em UTI, além de 16 especialidades médicas e exames laboratoriais e de imagem.
O problema é que o convênio não foi autorizado pelo Conselho Administrativo da Caixa, conforme denunciaram membros do órgão. Além disso, há informações de que informalmente os mutuários já estavam sendo atendidos no hospital, sem qualquer tipo de contrato. Veja aqui e também aqui
Atualmente, o hospital conta com 125 leitos e 473 funcionários. Os 120 médicos que atuam em 27 especialidades são prestadores de serviço, ou seja, são quarteirizados.
Sobre o tempo médio de permanência dos pacientes em internação houve diferenças entre os leitos destinados ao SUS e os da rede conveniada. No setor público a taxa foi de 4,38 dias, inferior ao observado nos leitos particulares.
A taxa de mortalidade geral ficou em 3%. No que se refere aos 237 partos realizados, o índice de cesárias chegou a 48%, considerado alto.