Organização Social que administra vários hospitais públicos é delatada por Sérgio Cabral

Organização Social que administra vários hospitais públicos é delatada por Sérgio Cabral

pro-saude

Não é de hoje que entidades do movimento social e órgãos públicos de fiscalização, como o Ministério Público e o Tribunal de Contas, questionam a atuação de organizações sociais (OSs), empresas teoricamente sem fins lucrativos que vem assumindo a gestão de diversos hospitais públicos Brasil afora. Com o discurso de modernizar e dar mais eficiência à gestão das unidades, os governos têm firmado contratos, terceirizando a gestão e fazendo repasses de verbas públicas, sem que a aplicação do dinheiro seja efetivamente fiscalizada. O resultado? Inúmeras denúncias de desvio de verbas e esquemas de propinas.

Mais uma dessas denúncias veia à tona, nesta semana, com a delação do ex-governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, que confessou à Justiça Federal um esquema com a Organização Social da Igreja Católica, Pró-Saúde, citando, inclusive, o possível envolvimento do próprio arcebispo do Rio, Dom Orani Tempesta.

A Pró-Saúde administra diversos equipamentos e serviços em vários estados. Em Cubatão, deixou na penúria o Hospital Municipal, na época em que a prefeita era Márcia Rosa (PT). Hoje a cidade aprofundou a terceirização, em um sistema similar à uma PPP da saúde.

Espírito Santo

No Espírito Santo, a Pró-Saúde tem contrato de gestão com a Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) para administrar o Hospital Estadual de Urgência e Emergência (HEUE), que ocupou, depois de reformada, a estrutura do antigo Hospital São Lucas, na Ilha de Santa Maria, em Vitória.

“Eu não tenho dúvida de que deve ter havido esquema de propina com a Igreja Católica. Da Pró-Saúde [OS] eu não tenho dúvida, o Dom Orani devia ter interesse nisso. Com todo respeito ao Dom Orani, mas ele tinha interesse nisso, tinha o Dom Paulo (sem dar o nome completo) que era padre e tinha interesse nisso e o Sergio Côrtes (ex-secretário de saúde do Rio) nomeou a pessoa que era o gestor do Hospital São Francisco, que fazia um belo trabalho, cá entre nós. Nós atendemos a idosos com trauma de quadril, por conta também desse vínculo com a profissão dele com os interesses do Iskin [Miguel]. Essa Pró-Saúde certamente tinha esquema de recursos que envolvia inclusive religiosos”, afirmou Cabral em vídeo do depoimento, divulgado na imprensa nacional.

A investigação da força-tarefa da Lava Jato contra o esquema de Cabral levou 21 pessoas à prisão. O ex-secretário de Saúde Sérgio Côrtes e os empresários Miguel Iskin e Gustavo Estellita estão entre os presos. Iskin tinha influência tanto sobre o orçamento e a liberação de recursos pela Secretaria de Saúde quanto sobre as contratações pela Pró-Saúde. Por isso, indicava empresas e fornecia a documentação necessária para a contratação. Segundo Skin, 10% do valor dos contratos eram divididos em propinas. Agora, as investigações se concentram em quem foram os beneficiados.

Em ao menos seis estados, onde também administra hospitais públicos, há processos contra a Pró-Saúde, como no Paraná, São Paulo, Tocantins, Pará, Goiás e Espírito Santo. A Associação é investigada pelo Ministério Público por má-gestão, falta de prestação de contas do que arrecada e investe, desvio de medicamentos, superfaturamento de serviços e por descumprir contratos de gestão, firmados com governos estaduais e municipais. Também responde a 2 mil protestos que somam cerca de R$ 20 milhões em dívidas. A lista de ações judiciais inclui reclamações trabalhistas por contratações irregulares, atraso nos salários e falta de pagamento de horas extras dos médicos e servidores da saúde.

De acordo com representantes do Sindicato dos Trabalhadores da Saúde no Estado (Sindsaúde-ES), o modelo de privatização/terceirização dos hospitais públicos por meio da entrega destas unidades para as OSs tem como resultado a piora das condições de trabalho e do atendimento à população, além do desvio de recursos públicos, como comprova a delação feita pelos executivos da Pró-Saúde, que confessaram o desvio de verbas públicas no Rio de Janeiro.

Para os representantes do sindicato, as experiências em outros estados brasileiros têm mostrado como este modelo de gestão privatista é prejudicial para a saúde pública.

Liderança sindical, Cynara Azevedo, da Secretaria de Condições de Trabalho do Sindsaúde-ES, questiona: “Como manter a Pró-Saúde atuando em terras capixabas diante de todas estas acusações comprovadas de desvio de verbas em diversos estados brasileiros? É recorrente noticiarem a prisão de executivos ligados à Pró-Saúde. Trata-se de uma quadrilha que já estendeu seus tentáculos no Espírito Santo. Qual o interesse nisso?”.

A Arquidiocese do Rio de Janeiro divulgou nota informando que o único interesse da Igreja Católica no Rio e de seu arcebispo, Dom Orani Tempesta, é de que as organizações sociais cumpram seus objetivos de servir ao bem comum, respeitando as leis. Já a Pró-Saúde diz que “tem colaborado com as investigações e, em virtude do sigilo do processo, não se manifestará sobre os fatos”.

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