A última terça e quarta (17 2 18) foram movimentadas na política da Paraíba. A Polícia Federal (PF) deflagrou a Operação Calvário – Juízo Final, para desarticular uma organização criminosa que desviou R$ 134,2 milhões dos recursos da saúde na Paraíba.
Para quem não lembra, a Operação Calvário levantou um dos maiores escândalos envolvendo organizações sociais da saúde e governos estaduais. No caso, a OS em questão é a Cruz Vermelha do Rio Grande do Sul, que gerenciava unidades médicas estaduais.
Entre os alvos desta última fase da operação estão o governador João Azevêdo (sem partido) e o ex-governador Ricardo Coutinho (PSB), que teve prisão preventiva decretada. A PF pediu a inclusão de seu nome na difusão vermelha da Interpol pelo fato de o político estar fora do País.
Além de Coutinho, a deputada estadual Estela Bezerra e a prefeita de Conde Márcia de Figueiredo Lucena Lira, ambas do PSB também são alvos de prisão preventiva no âmbito da Operação Calvário.
Ao todo, a ação pretendeu cumprir 54 mandados de busca e apreensão e 17 ordens de prisão preventiva nos Estados da Paraíba, Rio Grande do Norte, Rio de Janeiro, Goiânia e Paraná. Cerca de 350 Policiais Federais participaram das ações, além de procuradores e auditores da Controladoria-Geral da União.
Campanhas eleitorais
Do valor total desviado pelo grupo investigado, mais de R$ 120 milhões teriam sido destinados a políticos e às campanhas eleitorais de 2010, 2014 e 2018, diz a PF. A quadrilha teria ainda fraudado licitações e concursos públicos, além de ter superfaturado equipamentos, serviços e medicamentos.
Segundo a Polícia Federal, foi organizada uma rede de prestadores de serviços terceirizados e de fornecedores que fechavam contratos com sobrepreço na gestão dos Hospitais de Trauma de Mamanguape e do Metropolitano, em Santa Rita.
Para se blindar de fiscalização do Tribunal de Contas do Estado, a quadrilha teria pagado propinas e utilizado contratos de “advocacia preventiva” ou de “advocacia por êxito” para ocultar a movimentação dos valores, diz a corporação.
A investigação apontou ainda que houve uso eleitoral dos serviços de saúde, com direcionamento de atendimentos e fraude no concurso de pré-seleção de pessoal do Hospital Metropolitano no ano de 2018.
Segundo a PF, os investigados podem responder pelos crimes de organização criminosa, fraude em licitação e corrupção passiva e ativa.
Desencadeada inicialmente em dezembro de 2018, a Operação Calvário investiga uma quadrilha que teria praticado os crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e desvio de recursos públicos em contratos firmados com unidades de saúde e educação do Estado que, somados, ultrapassam R$ 1 bilhão.
Propinas x OSs
Nesta última quarta (18), a imprensa publicou desdobramentos da operação. Segundo o G1, Daniel Gomes, um dos investigados da Operação Calvário, confirmou ao Ministério Público como atuava o suposto esquema de distribuição de propinas e desvio de verbas nos contratos da saúde, na Paraíba.
Ele é um dos dirigentes da Cruz Vermelha. Em um dos trechos da conversa que teve com investigadores, ele reforçou o conteúdo da apuração e a existência do esquema.
- MP: […] pagamento de propina para contratação da OS para gestão do Hospital Metropolitano José Maria Pires e do pagamento de propina de 10% dos valores provisionados para a compra de equipamentos. O senhor ratifica integralmente?
Daniel: ratifico integralmente.
Em outro trecho, ele destacou a influência política que a deputada Estela Bezerra (PSB) tinha com a direção das OSs que administravam os hospitais paraibanos. Ele relata que nomeou, a pedido da deputada, a chefe de gabinete dela como secretária-geral da Cruz Vermelha na Paraíba.
De acordo com Daniel, mesmo no novo cargo, a secretária de Estela foi mantida na chefia de gabinete e devolvia o salário dela para a parlamentar.
- Daniel: eu recebi indicação da Livânia Farias e da Estela pra contratação da Maiara. A Maiara era chefe de gabinete da Estela. E quando eu contratei a Maiara era pra ser secretária-geral da Cruz Vermelha da Paraíba […] Tinha que preencher a lacuna paraibana com um presidente atuante e eu fiz o convite pra Maiara. A Maiara aceitou […] quando isso aconteceu ela veio conversar comigo e disse que tinha um problema, mas talvez podia ser uma solução ao mesmo tempo. ‘Eu continuo como chefe de gabinete da deputada e tô devolvendo o salário pra ela todos os meses. Teria algum problema de continuar assim como presidente, já que presidente, efetivamente, não tem salário? Você me pagaria o valor que você me paga’ […] não vi nenhum problema.
Relembrando todas as fases da Operação Calvário
A ação investiga a organização criminosa suspeita de desviar R$ 134,2 milhões de serviços de saúde e educação. Daniel é considerado um dos chefes da organização criminosa e foi preso na primeira fase da Operação Calvário.
A investigação identificou fraudes em procedimentos licitatórios e em concurso público, além de corrupção e financiamento de campanhas de agentes políticos e superfaturamento em equipamentos, serviços e medicamentos.
Segundo a “Operação Calvário – Juízo Final”, do valor total desviado, mais de R$ 120 milhões foram destinados a agentes políticos e às campanhas eleitorais de 2010, 2014 e 2018.
Em nota, a Cruz Vermelha disse Daniel Gomes não era diretor da instituição, mas conselheiro nacional. Alegou ainda que também foi vítima da suposta organização criminosa junto com o sistema público.
Estela Bezerra disse à TV Cabo Branco que se pronunciará sobre o caso através de uma entrevista coletiva porque ainda não se inteirou sobre a situação.
Já em outras gravações entregues por Daniel ao Ministério Público, ele comenta o projeto do grupo de passar a gestão da saúde do Conde, no Litoral Sul, para uma organização social.
- A proposta foi discutida, segundo ele, com o então governador Ricardo Coutinho (PSB) e com Márcia Lucena, prefeita do Conde. Os dois foram alvos de prisão na sétima fase da Operação Calvário.Daniel: no caso do Conde, por exemplo, a gente tá remodelando. Ricardo deu uma sugestão que a gente não pegasse, e ideia dela, e a gente discutiu com a Márcia, da gente assumir tudo. Mas de fato, ela vai tomar muita pancada, se for passar a saúde inteira para OS. Seria muito ruim. O que é que a gente decidiu. Deixa a atenção básica, as equipes de saúde na família com ela, que é basicamente mão de obra dela e a gente vai dar apoio pra eles (…) e a gente assumiria a policlínica.