A Secretaria de Saúde de Jaboatão dos Guararapes decidiu encerrar, antes do tempo previsto, o contrato sem licitação com uma organização social (OS) para operação do hospital de campanha da cidade.
A gestão municipal acatou um alerta de responsabilização do Tribunal de Contas do Estado (TCE), que constatou prejuízos aos cofres municipais com a terceirização do novo serviço.
O hospital de campanha era gerido por mais de R$ 23 milhões pela organização social de saúde Instituto Humanize, escolhida por dispensa emergencial. A unidade provisória de saúde está localizada no estacionamento do Centro Administrativo da Prefeitura, na Estrada da Batalha.
Fixado em um “valor global de R$ 23.470.308,04 no período de seis meses, para gerenciamento, operacionalização e execução de ações e serviços de saúde do Centro de Triagem e Tratamento para o Coronavírus (CTTC)”, o contrato para o hospital de campanha da Prefeitura tinha prazo de seis meses.
O TCE aponta irregularidades na escolha da organização social de saúde por dispensa e também fala em sobrepreço nos valores contratados e recebidos pela entidade privada. Houve também uma representação do Ministério Público de Contas de Pernambuco (MPCO), que além dos problemas já pontuados também observou supostas irregularidades na subcontratação de empresas pelo Instituto.
No documento os auditores do TCE indicaram que o valor do contrato apresentava um suposto sobrepreço de R$ 1.514.431,80 por mês.
Auditores do Tribunal de Contas, por orientação da relatora, também fizeram uma reunião com a equipe da Prefeitura, para expor as falhas. Em seguida, a Prefeitura comunicou, em ofício de 6 de julho, o “acolhimento total das medidas indicadas” pelo TCE e MPCO.
Haverá, segundo a Prefeitura, o encerramento do contrato, nas próximas semanas. A gestão municipal também fará um “encontro de contas”, para que os valores inicialmente recebidos a maior pelo Instituto sejam descontados nas parcelas que a organização social ainda tem a receber.
A Secretaria de Saúde de Jaboatão informou ainda, por ofício, que não irá selecionar outra organização social para o hospital de campanha, pois houve uma queda na demanda de leitos de covid-19 no município.
Segundo o ofício da Secretaria, a demanda poderá ser absorvida por outros leitos municipais, em outros estabelecimentos.
Irregularidades e sobrepreço
As irregularidades na dispensa emergencial foram levantadas pelo MPCO, em representação da procuradora geral Germana Laureano. Segundo a procuradora, o processo administrativo da Prefeitura para dispensa emergencial teve várias irregularidades.
Na representação do MPCO, foram apontados muitos problemas, entre eles “nulidade do empenho, que tem informação ideologicamente falsa”; “fortes indícios de incapacidade operacional do Instituto, pela precariedade da sua sede declarada”; e “conflitos de interesse no manejo das verbas públicas pelo Instituto Humanize, pois subcontratadas empresas que pertencem aos familiares dos integrantes da Diretoria”.
Já a equipe de auditoria do TCE apontou as seguintes irregularidades, dentre outras: parcelas de custeio eram maiores que os leitos efetivamente disponibilizados; falta de “composição de custos detalhada”; não cumprimento de prazos para a prestação de contas do Instituto para a Prefeitura; falta de publicação de informações da organização social e falta de controle, por parte da Prefeitura, sobre a aquisição de itens de almoxarifado.
Além dos problemas no contrato, em inspeção no local realizada em 6 de junho, os auditores do TCE constataram que “o Centro de Triagem e Tratamento para Coronavírus (CTTC) não estava disponibilizando a integralidade dos 131 leitos acordados no instrumento contratual, mas apenas 45 destes (sendo 40 de enfermaria e 5 de sala vermelha) e que apenas pequena parte desses estão ocupados”.
Mesmo assim, até a atuação do TCE, os valores fixados no contrato estavam sendo pagos de forma integral, sem desconto.
O que dizem os envolvidos
A Prefeitura de Jaboatão disse que a desativação do hospital de campanha ocorrerá em razão da redução dos casos de coronavírus na cidade.
O Instituto Humanize negou irregularidades e disse que o contrato foi cumprido de forma “exitosa e exemplar”.
Exceção
Vale lembrar que na maioria dos casos, o levantamento e acompanhamento de processos por parte dos órgãos de controle de contas demoram anos e anos. A maioria das análises e julgamentos começa a acontecer mais de cinco anos depois da assinatura dos contratos investigados, o que favorece muito a impunidade e a margem de manobra que as entidades privadas têm para continuar atuando em outras cidades e Estados normalmente.
Porque a terceirização é nefasta
Os contratos de terceirização na Saúde e demais áreas, seja por meio de organizações sociais (OSs), seja via organizações da sociedade civil (OSCs) são grandes oportunidades para falcatruas pelo encontro de intenções entre administradores dispostos a se corromper e prestadores que montam organizações de fachada para estruturar esquemas de ganhos ilegais para ambas as partes.
As fraudes proliferam pela existência de corruptos e corruptores, em comunhão de objetivos, mas também pela facilidade que esta modalidade administrativa propicia para a roubalheira. Gestões compartilhadas com OSs e termos de parceria com OSCs não exigem licitações para compras de insumos. As contratações de pessoal também tem critérios frouxos, favorecendo o apadrinhamento político.
A corrupção, seja de que tipo for, é duplamente criminosa, tanto pelo desvio de recursos públicos já escassos quanto pela desestruturação de serviços essenciais como o da saúde, fragilizando o atendimento da população em pleno período de emergência sanitária.
Lucro acima da vida
Todos estes anos de subfinanciamento do SUS, de desmantelamento dos demais direitos sociais, de aumento da exploração, acirramento da crise social, econômica e sanitária são reflexos de um modo de produção que visa apenas obter lucros e rentabilidade para os capitais. Mercantiliza, precariza e descarta a vida humana, sobretudo dos trabalhadores. O modelo de gestão da Saúde por meio das Organizações Sociais é uma importante peça desta lógica nefasta e por isso deve ser combatido.
Não à Terceirização e Privatização da Saúde Pública! Em defesa do SUS 100% Estatal e de Qualidade!