As Unidades de Saúde de Pronto Atendimento (UPAs) de Santos, cujo serviço é terceirizado para organizações sociais (OSs), sempre foram mal avaliadas pelos munícipes que usam o serviço.
Com a pandemia de coronavírus, a situação está ainda mais grave, em razão do aumento do número de pacientes com suspeitas procurando assistência médica, da ineficiência das gestoras em atender a nova demanda e das equipes reduzidas de funcionários.
Uma usuária do serviço que pede para não ter seu nome divulgado contou ao Ataque aos Cofres Públicos como o modelo de gestão implantado pelo Prefeito Paulo Alexandre Barbosa (PSDB) impacta no cotidiano dos munícipes que contraíram o Covid-19 e na rotina dos demais usuários, que precisam do serviço por outros motivos.
A experiência dela foi na UPA da Zona Leste, unidade recém-inaugurada e gerida pela organização social Pró-Saúde. A Pró-Saúde tem problemas com a Justiça, Tribunal de Contas e com denúncias de mau atendimento em diversas cidades de São Paulo e de outros estados.
Ela conta que depois que sua cunhada foi internada em estado grave com a doença, acabou também contraindo o vírus. “Fui no dia 17 de novembro para a UPA já com o encaminhamento e pedido do exame PCR assinado pelo médico do hospital onde estava da minha cunhada. Cheguei lá já com febre e mal estar. Mesmo assim, passei por situações que nenhuma pessoa neste estado deveria passar”.
Ela conta que o documento de encaminhamento que frisava a suspeita da doença não valeu de nada para superar a burocracia. “A gente fica misturado com os outros pacientes por horas. Primeiro na sala da recepção e depois no corredor onde esperamos para fazer o exame”, cotou.
Segundo a paciente, depois de pegar a senha ela teve de esperar mais de uma hora para passar pela triagem e fazer a ficha. Depois foi mais uma hora para passar pelo médico. Mas o problema maior foi aguardar para colher o exame do tipo PCR (swab nasal). “Perdi as contas de quanto tempo esperei em um corredor estreito, sem lugar nem para sentar. Estava muito mal e não aguentei. Só sei que cheguei às 15h30 e fui embora 19h20 sem fazer o teste. Preferi colher no dia seguinte, em uma clínica particular, pois já não aguentava mais aguardar ali passando mal”.
A usuária conta que só havia uma médica atendendo os casos de Covid e que na hora de colher a amostra nasal ela descobriu que apenas uma funcionária – exausta – se dividia em três tarefas: ministrar medicação para todos os pacientes, colher exames (inclusive os de PCR) e ainda fazer novas fichas para quem estava sendo testado.
“Ela tinha que trabalhar em três salas diferentes: sala de medicação e curativos, sala da coleta de exame e um outro recinto onde preenchia as fichas dos pacientes. Isso porque a colega que deveria estar com ela teve que auxiliar outros casos de emergência em outro andar”, lembra.
Os pacientes mais indignados chegaram a chamar uma representante da gestora, mas ela nada resolveu.
O resultado do teste, feito no dia posterior, em um clínica particular, confirmou a doença. “Fico imaginando quantas pessoas eu posso ter infectado e quantas pessoas que também estavam com a doença naquele espaço confinado proliferaram o vírus só naquele dia”.
E conclui: “será que essas tantas pessoas que a gente vê morrendo estão morrendo só pelo Covid-19 ou suas mortes não são também produto da ineficiência deste sistema, que lucra com a terceirização, com a exploração de funcionários e com a negligência aos doentes? Será que essa Prefeitura não vê que terceirizar o setor público trazendo empresas ineficientes não gera ainda mais gastos no futuro para a sociedade como um todo?”.
Muito dinheiro
A Prefeitura paga para a Pró-Saúde R$ 20,6 milhões por ano, além do custeio de R$ 1,4 milhão em equipamentos, mobiliário e identidade visual.
Por mês a entidade recebe R$ 1,7 milhão.
Abaixo fizemos um compilado resumido dos muitos problemas que a empresa acumula em seu histórico junto ao SUS. Há matérias publicadas pelo Ataque aos Cofres Públicos e também por outros veículos de comunicação.
2014
Pró-Saúde é investigada em seis estados por irregularidades
Justiça de Uberaba determina a suspensão dos contratos com a Pró-Saúde
MP de Tocantins pede afastamento de prefeito e secretários de Araguaína por contratar OS
Pró-Saúde de novo envolvida em polêmicas
2015
Aumenta número de protestos em cartório em nome da Pró-Saúde
Justiça condena Pró-Saúde a pagar R$ 500 mil por dano moral coletivo
Aumenta o número de mortes em UPAs geridas pela Pró-Saúde em Uberaba
Calotes e irregularidades marcam história da Pró-Saúde em Cubatão
Câmara de Uberaba vai investigar contrato com Pró-Saúde
Cinco mortes de bebês no Hospital Municipal de Cubatão gerenciado pela Pró-Saúde
Comissão diz que atendimento da Pró-Saúde é deficitário em Uberaba
Contas irregulares em Cubatão: TCE rejeita embargos da Pró-Saúde
Hospital de Campinas poderá ser administrado por OS que levou caos a várias cidades
Hospital de Cubatão: médicos sem salários, falta de material e mortes
Pró-saúde deixa profissionais do SAMU sem salários
Terceirizados da Pró-Saúde ficam sem salários em Cubatão e pacientes ficam na mão
Terceirizados do Hospital Carlos Chagas cruzam os braços
Justiça dá prazo de 30 dias para Pró-Saúde repassar ao município de Araguaína a gestão da saúde
Morte de bebê na porta de hospital controlado por OSs vira caso de polícia
MP dá 24 horas para a Pró-Saúde explicar porque pacientes não conseguem fazer exame
Pró-Saúde e Prefeitura de São Vicente condenadas por convênio sem licitação
2016
Conselho vai auditar contas das OSs que comandam UPA e postos de saúde em Catanduva
TCE suspende terceirização da Saúde em Catanduva
Cubatão: Pró-saúde atrasa salários do hospital municipal
Falta de atendimento em UPA terceirizada vira caso de polícia
OS gasta R$ 390 mil de dinheiro público em viagens
Pró-Saúde entrega Hospital de Caxias e Sindicato dos Médicos vai à Justiça
2017
Cubatão: Pró-Saúde é reprovada mais uma vez
Terceirização do hospital de Cubatão pela Pró-Saúde é reprovada em definitivo
Decreto abre processo administrativo contra a Pró-Saúde, em Uberaba
Após intervenção municipal, Pró-Saúde abandona contrato de UPAs em Uberaba
Prefeito de Uberaba assina rescisão unilateral com a Pró-Saúde na gestão das UPAs
Em Sumaré nova OS assume após estragos feitos pela Pró-Saúde
Prefeitura de Sumaré decreta intervenção em UPA gerenciada pela Pró-Saúde
Justiça manda Pró-Saúde indenizar terceirizados
Médicos de Uberaba desmascaram OS Pró-Saúde e denunciam UPAs terceirizadas e sucateadas
Pró-Saúde descumpre condições de edital em Catanduva
Pró-Saúde pode ser multada no Rio por paralisação de Hospital
Ratos invadem em hospital terceirizado no Rio
2018
Juiz da Lava Jato solta empresário da OS Pró-Saúde envolvido em desvios na saúde
TCE condena Pró-Saúde a devolver R$ 5,2 milhões por irregularidades em Cubatão
Pró-Saúde terá de devolver R$ 1,5 milhão à Prefeitura
Caso Pró-Saúde: ex-secretário de Saúde do Rio volta a ser preso
Chefe de fiscalização da Saúde do Rio recebeu propina de R$ 450 mil da Pró-Saúde, diz MP
MPF denuncia Sérgio Côrtes por desvio de R$ 52 milhões por meio da OS Pró-Saúde
Mulher morre após ter atendimento negado em Hospital terceirizado do Rio
Parentes de mulher que morreu ao ter atendimento negado vai processar Governo do Rio e OS
Pró-Saúde é responsabilizada por desfalques aos cofres de Cubatão
2019
Organização Social que administra vários hospitais públicos é delatada por Sérgio Cabral
Tribunal de Contas determina que Pró-Saúde devolva R$ 2,2 milhões à Prefeitura de Mogi
Governo do Espírito Santo trocou uma OS ficha suja por outra
Hospital terceirizado para OS vai ser alvo de auditoria no Pará
Justiça bloqueia bens da Pró-Saúde após calote a terceirizados
Pró-Saúde dá calote em terceirizados; trabalhadores se uniram em protesto
Justiça determina bloqueio de R$ 700 mil da Pró-Saúde; OS administrava hospital municipal em Mogi
Operação da PF envolve OS Pró-Saúde e propina para servidores do Pará
Pró-Saúde deve para Deus e o mundo e dinheiro público não chega onde deveria
Pró-Saúde é condenada a devolver de R$ 800 mil usados indevidamente em terceirização no Paraná
TCE julga irregular a terceirização de exames em São Vicente
O que está por trás da terceirização
Disfarçadas sob uma expressão que esconde sua verdadeira natureza, as OSs não passam de empresas privadas, que substituem a administração pública e a contratação de profissionais pelo Estado. Várias possuem histórico de investigações e processos envolvendo fraudes, desvios e outros tipos de crimes.
No setor da saúde, essas “entidades”, quando não são instrumentos para corrupção com dinheiro público, servem como puro mecanismo para a terceirização dos serviços, o que resulta invariavelmente na redução dos salários e de direitos. No meio desta pandemia, além do medo de se contaminar e contaminar assim os seus familiares, profissionais da saúde enfrentam também a oferta despudorada de baixos salários e falta de estrutura de trabalho, o que contrasta com a importância da atuação deles no combate ao COVID-19.
É evidente que o saldo para a sociedade é a má qualidade do atendimento, o desmonte do SUS e, pior ainda: o risco às vidas.
Todos estes anos de subfinanciamento do SUS, de desmantelamento dos demais direitos sociais, de aumento da exploração, acirramento da crise social, econômica e sanitária são reflexos de um modo de produção que visa apenas obter lucros e rentabilidade para os capitais. Mercantiliza, precariza e descarta a vida humana, sobretudo dos trabalhadores. O modelo de gestão da Saúde por meio das Organizações Sociais é uma importante peça desta lógica nefasta e por isso deve ser combatido.
Não à Terceirização e Privatização da Saúde Pública! Em defesa do SUS 100% Estatal e de Qualidade!