Mais uma família chora um luto por suspeitas de falhas ou negligências em hospitais terceirizados para organizações sociais. Em destaque na imprensa do litoral paulista está o caso de Adriana Suely, de 23 anos, que procurou o Hospital dos Estivadores, gerenciado pelo Instituto Social Hospital Alemão Oswaldo Cruz.
A gestante foi até o equipamento para conceber sua filha e passou por momentos terríveis. Primeiro lhe foi dito pelos médicos que os exames da criança estavam satisfatórios. Porém, induzida a fazer parto normal a contragosto, a bebê acabou nascendo sem vida.
Veja abaixo, na íntegra, a matéria do Jornal A Tribuna:
Jovem denuncia hospital de Santos após filha nascer morta: Exames diziam que ela estava ótima
Adriana Suely, de 23 anos, foi induzida ao parto normal por quase três dias, enquanto pedia por cesárea
Ao buscar atendimento médico em Santos, a moradora de Guarujá, Adriana Suely de Paulo Navarrete, acreditou que sairia do Complexo Hospitalar dos Estivadores com sua primeira filha no colo. Porém, a jovem de 23 anos precisou voltar para casa apenas com a dor do luto. Ela diz que foi vítima de negligência médica, pois sua bebê nasceu sem vida momentos após os médicos dizerem que os exames estavam ótimos.
A mulher ainda denuncia que foi induzida ao parto normal, mesmo implorando por cesárea. Adriana foi internada na última terça-feira (14), perdeu a filha dois dias depois e, no último sábado (18), teve alta e enterrou a bebê. “Foi uma coisa inexplicável. Quando ela saiu da barriga, eles fizeram massagem nela, mas logo percebi que a bebê não chegou a respirar e nem chorar. Ela já saiu morta da barriga. Mas, como? Tiveram milhões de exames dizendo que estava tudo ótimo”.
A jovem conta que foi ao complexo hospitalar com objetivo de ter a bebê no mesmo dia. “Fui com uma cartinha da minha obstetra alegando que eu tinha que entrar em trabalho de parto porque estava fazendo 40 semanas e alguns dias”, ressalta, enfatizando ainda que possui problemas com a tireoide e pressão.
Adriana diz que inicialmente foi atendida por duas médicas que fizeram perguntas e verificaram sua pressão, oxigenação e glicemia. “Informei que na madrugada do dia 14, comecei a perder um líquido bem ralinho. Uma delas me mandou deitar na maca, fez o exame de toque e falou que era líquido amniótico, mas bem pouquinho”.
A jovem conta que foi encaminhada para internação após ser elogiada pelas profissionais, que disseram que aquele dia era o certo para procurar atendimento médico. Ao assinar a papelada da internação, Adriana escolheu a mãe como acompanhante e iniciou os exames pedidos pelas médicas. Foi quando fez, pela primeira vez, o exame de cardiotocografia (CTG), que monitora a frequência cardíaca fetal e as contrações uterinas. “Deitei, e a enfermeira deu toda assistência, ficou aferindo minha pressão e os batimentos do bebê”, conta.
Após cerca de três horas, Adriana foi encaminhada para a sala de indução, onde havia outras gestantes. Ela fez outro exame de sangue e foi questionada sobre o plano de parto. “Eu fiz (o plano de parto) pedindo cesariana, porque a minha médica já tinha me dito que a bebê era grande, estava alta e não seria um parto fácil, pois era meu primeiro filho. Então minha preferência era fazer a cesárea, principalmente porque chegou até o final da gestação, não estourou bolsa, nem teve aquela coisa natural”.
A jovem relata que decidiu ir ter a filha em Santos justamente porque queria a cesariana, porém, no Complexo Hospitalar dos Estivadores, teve uma conversa com uma obstetra que falou sobre os benefícios do parto normal. “Falou que a cesárea é uma cirurgia de grande porte, que a neném estava ótima, estava tudo correndo bem e que eu poderia tentar. Ela falou: vamos tentar, vamos ver como que vai evoluir”.
Foi neste momento, que Adriana foi orientada a fazer uso do comprimido Misoprostol, conhecido como ‘miso’, que serve para induzir o parto. “Quando colocou o primeiro já me assustou, pois eles disseram que poderia colocar até nove comprimidos, de três em três horas, depois de seis em seis horas. E aí já me assustei, perguntei se ia demorar demais e falaram que não. Isso durou dia 14 e dia 15”.
Na madrugada de quinta-feira (16), a jovem começou a estranhar, pois todas as mulheres da sala tinham os filhos e iam embora. “Fui ficando e não sentia dor de parto. Comecei a questionar se estava demorando muito, principalmente sem ter feito ultrassom ou exame mais específico, só CTG. Me responderam que estava tudo bem”.
Ela lembra que antes de aplicarem o sexto comprimido, o exame CTG registrou um batimento fraco da nenê, que mobilizou a equipe médica. “Veio outra médica e enfermeira e mexeram na barriga, balançaram disseram que ela (bebê) estava dormindo, que iriam acordá-la e tinha normalizado. Perguntaram se eu ouvia e eu estava ouvindo o barulho do aparelho, pois não sou médica e não sei diferenciar. Respondi que sim, mas percebi que uma das médicas pediu pra suspender o comprimido”, relembra, dizendo que houve uma falta de comunicação entre a equipe, pois enquanto uma médica suspendeu o ‘miso’ até segunda ordem dizendo que era necessário refazer o exame CTG em vinte minutos, uma enfermeira apareceu com o comprimido. “Tudo começou a sair dos trilhos”, desabafa Adriana.
Ela lembra que a enfermeira afirmou que outra médica analisou o exame anterior e orientou a permanência da medicação. “Falaram para eu e minha mãe ficarmos despreocupadas, pois o CTG tinha sido feito em menos de meia hora e ainda estava dentro do prazo. Eu estava ali há quase três dias, então confiava nos médico. Mas colocaram o comprimido, começou o pesadelo”.
A jovem conta que em menos de cinco minutos, sentiu uma dor “insuportável” e começou a pedir pela cesárea. “Mas toda vez que a gente falava, eles vinham com uma lista de problemas que a cirurgia poderia me trazer”. Ela diz que gritava pedindo a cesárea por conta das dores e o médico foi refazer o exame de toque. “Ele falou: ‘olha você já está de três centímetros, só que a bebêzinha fez um cocozinho’.
Eu olhei pra minha mãe e ela perguntou se era perigoso ela aspirar ou comer, mas responderam que era normal, que o intestino dela estava funcionando e ela está pronta pra nascer”. Durante um exame CTG, a jovem notou alterações, mas foi tranquilizada pela enfermeira, que afirmou que estava tudo bem. “Falaram que o coraçãozinho dela estava batendo como se fosse um ritmo de música”.
Ainda com dores, Adriana insistiu até conseguir assinar um documento pedindo a cesárea e partiu para a sala de cirurgia. “Quando eles tiraram ela, já não tinha vida nenhuma. Nem certidão de nascimento eu vou conseguir fazer, porque ela já nasceu morta. Então como que eles fizeram tantos exames, estava tudo tão bem e ela já estava morta?”, desabafa a mulher, que diz ter visto o batimento cardíaco da filha momentos antes do parto. “Na hora que o médico veio me dar o papel para fazer a cesariana, ele fez um examezinho em um aparelho portátil que escutava o batimento cardíaco dela, colocou do lado do meu ouvido, eu estava com muita dor, mas eu conseguir ver que estava 133. Como que estava 133 numa sala e em questão de minutos, ela saiu morta da barriga? Ela já estava morta e eu falei o dia inteiro que não estava mexendo”.
A família registrou um boletim de ocorrência por morte suspeita e o enterro da criança aconteceu no último sábado (18), em Guarujá.
Resposta
A reportagem de A Tribuna entrou em contato com o hospital, que emitiu a seguinte nota: “O Complexo Hospitalar dos Estivadores, por meio da sua equipe técnica multiprofissional, informa que a paciente e seus familiares receberam assistência integral, suporte e acolhimento diante do caso em questão, e foram fornecidas todas as informações disponíveis até o momento. O apoio aos familiares continuará sendo fornecido pela instituição, até que a análise técnica do evento seja concluída”.
Aqui no Ataque aos Cofres Públicos já fizemos matérias mostrando familiares de pacientes atendidos no Hospital dos estivadores denunciando casos suspeitos de negligência e erro médico.
Em janeiro de 2020 mostramos o drama da família de Clodualdo de Jesus, de 77 anos. Os parentes contam que após ele ficar internado em dezembro de 2021, por 11 dias no Hospital, recebeu alta precocemente. Tanto que em casa piorou e teve de buscar atendimento na UPA da Zona Noroeste uma semana depois. Mais detalhes aqui.
Na mesma semana, só que no dia 13 de janeiro de 2020, mostramos também que uma moradora da Zona Noroeste de Santos, cujo pai estava internado no Hospital dos Estivadores, resolveu pedir ajuda no Facebook para preservar a vida do idoso.
Julyana Tavares Apolinário detalhou os motivos de sua preocupação na página Zona Noroeste.
Para ela, o tratamento dado a Antonio Marcos Apolinário foi insuficiente e só se agravou desde que ele deu entrada no hospital, em 23 de dezembro de 2019. A família conta que ele entrou andando, com queixas de dores fortes no lado esquerdo do peito, perto do ombro. Agora está totalmente debilitado, sem sequer conseguir comer sozinho.
A possibilidade de um princípio de infarto foi descartada. Para Julyana, houve uma remoção precipitada do pai da UTI para o setor de clínica médica. Além disso, só duas semanas depois de ingressar no Hospital os médicos descobriram que o marca passo do pai está contaminado e que seria necessária uma cirurgia.
E a demora ocorreu apesar da família ter avisado sobre a existência do marca passo no primeiro dia de internação. Até o último dia 13, ela aguardava pela operação de retirada do dispositivo. Mas essa cirurgia só poderia ser feita na Santa Casa de Santos.
Logo que foi selecionada para gerenciar o Hospital Municipal, a OS Instituto Social Hospital Alemão Oswaldo Cruz foi questionada na Justiça por não ter a experiência mínima de três anos, exigida em lei municipal. Na época em que foi qualificada como OS, a empresa tinha sido criada há 14 meses e não possuía no currículo nem mesmo um dia de gestão em serviço público.
Abaixo listamos mais matérias envolvendo denúncias de ineficiência na gestão do Hospital dos Estivadores pela OS Instituto Social Hospital Alemão Oswaldo Cruz:
OS que comanda Estivadores não cumpre todas as metas no Hospital
Mãe que perdeu bebê no Hospital dos Estivadores pede investigação criminal no Ministério Público
Mãe relata drama após ter seu bebê no Hospital dos Estivadores
Gestantes denunciam práticas na Maternidade dos Estvadores
Pai vai à imprensa para denunciar falta de estrutura no Hospital dos Estivadores
Hospital dos Estivadores: advogado entra com representação criminal contra OS e Prefeitura
Mais um parto traumático no Hospital dos Estivadores, em Santos
CONTRA TODAS AS FORMAS DE TERCEIRIZAÇÃO
Disfarçadas sob uma expressão que esconde sua verdadeira natureza, as organizações sociais (OSs), organizações da sociedade civil (OSCs) e oscips não passam de empresas privadas, que substituem a administração pública e a contratação de profissionais pelo Estado. Várias possuem histórico de investigações e processos envolvendo fraudes, desvios e outros tipos de crimes.
No setor da saúde, essas “entidades”, quando não são instrumentos para corrupção com dinheiro público, servem como puro mecanismo para a terceirização dos serviços, o que resulta invariavelmente na redução dos salários e de direitos dos trabalhadores.
Falando em ensino público municipal, a Educação Infantil tem cada vez mais unidades subvencionadas para entidades que recebem dinheiro público e não são fiscalizadas. A assistência social também tem sido rifada desta mesma forma pelo atual governo.
É evidente que todo esse processo de terceirização à galope em todo o Brasil traz como saldo para a sociedade a má qualidade do atendimento e o desmonte das políticas públicas.
Todos estes anos de subfinanciamento do SUS e demais serviços essenciais, de desmantelamento dos direitos sociais da classe trabalhadora, aumento da exploração e acirramento da crise social, econômica e sanitária são reflexos de um modo de produção que visa apenas obter lucros e rentabilidade para os capitais.
Mercantiliza, precariza e descarta a vida humana, sobretudo dos trabalhadores, enquanto executores dos serviços ou enquanto usuários destes mesmos serviços. O modelo de gestão pública por meio das Organizações Sociais e entidades afins é uma importante peça desta lógica nefasta e por isso deve ser combatido sempre.
E vem aí a Reforma Administrativa por meio da PEC 32, em rápida tramitação no Congresso. O objetivo, como sempre, é simplesmente acabar com o serviço público como conhecemos e transformar as administrações em grandes cabides para contratação de indicados e cabos eleitorais com total respaldo da lei. Também vai, na prática, acabar com os concursos públicos.
O dinheiro público agora poderá ser desviado oficialmente para as empresas amigas, campanhas eleitorais e as rachadinhas (aquele esquema em que o político contrata alguém, mas exige que o contratado deposite parte do próprio salário na conta do político).
A Reforma não acaba com regalias, nem mexe com quem enriquece com elas. Ao contrário, mantêm os privilégios e os altos salários de juízes, políticos, promotores, diplomatas, cúpula dos militares e outros.
O único objetivo dessa Reforma é piorar os serviços públicos e atacar os servidores que atendem a população mais vulnerável.
Não à Terceirização e Privatização dos serviços públicos! Contra da PEC 32 e em defesa das políticas públicas!