Agentes de saúde comunitários terceirizados fizeram uma manifestação em frente à Prefeitura de São Paulo, no início da tarde desta quarta-feira (9), no Centro da capital.
Mais de mil de funcionários cobram aumento salarial e melhores condições de trabalho. Eles paralisaram os serviços a partir desta quarta-feira (9).
Os profissionais fazem parte do Programa Estratégia da Família e atuam nos territórios das 470 Unidades Básicas de Saúde (UBS) da capital, percorrendo os bairros e comunidades. Eles conversam com os moradores para saber das suas necessidades em saúde e fazer o encaminhamento às unidades.
Os trabalhadores são funcionários de organizações sociais (OSs) contratadas pela prefeitura, que recebem repasses do Ministério da Saúde para efetuar os pagamentos. Segundo o Sindicato, a categoria não recebeu nenhum ajuste salarial.
Em nota, a Prefeitura de São Paulo disse defender o direito à livre manifestação dos agentes de saúde e a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) e alega que está aberta e em constante diálogo com representantes da categoria. Mas não explicou o motivo das OSs não cumprirem o direito à reposição salarial, mesmo recebendo verba para isso.
Desde os anos 2000, no município de São Paulo, grande parte dos serviços da política de saúde pública passa a ser executada pelas Organizações Sociais (OS), havendo uma crescente apropriação do fundo público por essas entidades privadas. Artigo científico da aluna de medicina da USP, Daniele Correia, mostra que entre 2011 e 2021, houve um crescimento percentual de recursos destinados pelo Fundo de Saúde para as OSs do montante empenhado para ações e serviços de saúde, que passaram de 20,1% a 89,2%, representando R$ 1,7 e R$ 10,6 bilhões, respectivamente.
“Constatou-se que o Fundo de Saúde do município de São Paulo foi se distanciando dos objetivos de sua criação, quando dispostos na Lei nº 13.563/2003. (…). Isso porque, ao ser crescentemente apropriado pelas modalidades privatizantes de gestão na saúde, como as OSs, desde então, ainda que tenha garantido a descentralização do orçamento da Secretaria com relação governo municipal como um todo, seus recursos não foram priorizados para serem destinados ao caráter público do SUS local, conforme determinado em lei municipal, apoiado na Lei federal nº 8.142/90”, diz o artigo.
O documento ressalta que a administração direta como forma de gestão para o desenvolvimento das ações e dos serviços de saúde foi sendo abandonada pelo município, e os recursos do Fundo de Saúde foram fortalecendo o caráter privado dessas ações e serviços, principalmente no âmbito da atenção básica. Abaixo transcrevemos os últimos parágrafos das conclusões:
“É digno de nota que esse distanciamento do caráter público do SUS municipal é perceptível quando se analisam os ‘Contratos de Gestão’ das OSS, e que as informações de interesse público são escassas. Ainda mais agravante é a falta de informações a respeito dos ‘Convênios’ e ‘Termos de Fomento’ estabelecidos pela SMS/SP para se proceder à avaliação dos resultados da política de saúde, restringindo-se a dados dos recursos executados.
Sendo assim, este estudo reconhece que o fundo público de saúde em São Paulo vem sendo configurado como um processo de ‘mercantilização implícita’ por meio das OS, tendo parte significativa do orçamento do SUS municipal orientada às modalidades de gestão privada, o que torna a distribuição de recursos públicos voltada para o fortalecimento dos interesses privados.
Pretende-se, ainda, alertar e corroborar com este trabalho, que, no caso de São Paulo, se está caminhando na rota de privilegiar o setor privado na saúde, cenário que se pretendia superar ao ser concebida a Reforma Sanitária Brasileira. A conjuntura atual da maior cidade brasileira cede cada vez mais à apropriação mercantil de recursos monetários acumulados pela classe trabalhadora, na contramão de um projeto de sociedade que assegure a manutenção de um sistema público e universal de saúde.”