A Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo do Tribunal de Justiça (TJMT) manteve o advogado Edmilson Paranhos de Magalhães Filho réu num processo que apura desvios de R$ 8,4 milhões na saúde pública do Estado. Os magistrados da Terceira Câmara seguiram por unanimidade o voto do desembargador Márcio Vidal, relator de um recurso ingressado pelo advogado contra uma decisão anterior do processo que também negou sua absolvição.
A sessão de julgamento ocorreu no último dia 17 de junho. No recurso, o advogado alegou que houve “conversão” do processo que apura as irregularidades para uma ação de “improbidade administrativa”.
Edmilson Paranhos de Magalhães Filho é réu por ter representado o Instituto Pernambucano de Assistência à Saúde (Ipas), uma organização social de saúde (OSS) num modelo de gestão do setor implementado na administração do ex-governador Silval Barbosa.
Ele assinou o contrato com o Governo do Estado em nome da organização. “Adotada” pelo então secretário estadual de saúde, Pedro Henry, no ano de 2011, as organizações sociais representam uma “terceirização mascarada” do setor, e nunca foram consenso entre políticos, servidores públicos e principalmente a população.
Denúncias de mau atendimento, e até mesmo corrupção, marcaram a gestão das OSs em Mato Grosso na década de 2010. No ano de 2014, um vereador de Alta Floresta (800 Km de Cuiabá) revelou que faltava comida no hospital regional presente no município, gerido pelo Ipas.
A mesma situação também foi verificada no Hospital Regional de Colíder (656 km de Cuiabá), também administrado pelo Ipas. Contra a empresa, pesavam denúncias de falta de pagamento com fornecedores, precarização no atendimento à população, além de inexistência de alvarás obrigatórios notificados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Em janeiro de 2017, os médicos do Hospital Metropolitano, em Várzea Grande, cruzaram os braços num protesto por quatro meses de atrasos de salários – mesma atitude tomada pelos enfermeiros pouco antes, que reclamaram da “falta de estrutura e de pessoal”. O Ipas fazia a gestão da unidade de saúde, que sofreu uma intervenção do Governo do Estado.
Os supostos desvios de R$ 8,4 milhões ocorreram justamente no Hospital Metropolitano em razão da suspeita do Ipas ter recebido recursos públicos, mas não ter contratado médicos, nem comprovado a realização de serviços.
Mais falcatruas em MT
O conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE/MT), Guilherme Maluf, suspendeu uma licitação para a contratação de uma organização social de saúde para fazer a gestão do Hospital Regional de Cáceres (222 Km de Cuiabá).
Segundo uma inspeção realizada pelo próprio TCE para analisar o edital de chamamento público para convocar as OSs interessadas no negócio, há diversas irregularidades e vícios que não foram observados pelo Poder Executivo de Mato Grosso.
Entre as suspeitas, conforme a Corte de Contas, está um sobrepreço de 245% sobre o valor que a OSS irá receber por mês do Governo do Estado para gerir o Hospital Regional de Cáceres. Conforme o edital, um dos parâmetros adotados na composição dos valores que a OS contratada irá receber é o número de atendimentos de pacientes. Segundo o Governo do Estado, há uma previsão de que 4.460 pessoas deverão buscar consultas médicas no Hospital Regional de Cáceres, por mês. A métrica compõe o valor estimado de R$ 18,5 milhões que a organização vencedora deve receber do Poder Executivo Estadual mensalmente.
Ocorre, no entanto, que o sistema de informações hospitalares do SUS (SIH) aponta uma média de menos de um quarto do que a previsão, de 1.022 pacientes – o que reduziria o valor para R$ 5,2 milhões (diferença de 245%). A estimativa também leva em conta informações do DataSUS, do Ministério da Saúde.
Em decisão publicada nesta terça-feira (1º de julho), o conselheiro Guilherme Maluf considerou uma meta “ambiciosa” a inflação dos números presente no edital. “Esta projeção ambiciosa requer avaliação criteriosa quanto à sua viabilidade operacional e estrutural”, analisou Maluf. O conselheiro da Corte de Contas também chamou a atenção de que a própria Procuradoria-Geral do Estado (PGE), ligada ao Poder Executivo Estadual, apontou os vícios e irregularidades identificadas na inspeção do TCE, porém, nada foi feito pela Secretaria de Estado de Saúde (SES-MT).
Além dos “números inflados”, a PGE e o TCE também apontaram as faltas de estudos técnicos dos custos da iniciativa, de um parecer do Conselho Estadual de Saúde, da justificativa de contrato único para duas unidades de saúde (o Hospital Regional de Cáceres e seu Anexo I) e outras suspeitas. Maluf deu 30 dias para a SES regularizar o processo e esclarecer seus pontos controversos.
Na década de 2010, as OSSs também foram a opção adotada pelo Poder Executivo de Mato Grosso, na gestão do ex-governador Silval Barbosa, para “solucionar” os problemas da saúde pública. Diversos hospitais regionais do Estado tiveram que sofrer “intervenção” do Poder Executivo Estadual pelo atendimento precário dessas organizações, além de suspeitas de corrupção.
Um dos casos mais emblemáticos é o do próprio Instituto Pernambucano de Assistência à Saúde (Ipas), que fazia a gestão dos hospitais regionais de Alta Floresta, Colíder, além do Metropolitano, de Várzea Grande.
Outro exemplo de má prestação de serviços de saúde, e uso do dinheiro público, foi do Instituto Gerir, que controlava os hospitais regionais de Rondonópolis e Sinop. No ano de 2018, já no fim da gestão Pedro Taques, médicos e enfermeiros cruzaram os braços por falta de pagamento de salários nas unidades de saúde.
CONTRA TODAS AS FORMAS DE TERCEIRIZAÇÃO E PRIVATIZAÇÃO!
Como se vê, terceirizar os serviços é fragilizar as políticas públicas, colocar a população em risco e desperdiçar recursos valiosos com ineficiência, má administração ou até má fé de entidades privadas.
Disfarçadas sob uma expressão que esconde sua verdadeira natureza, as organizações sociais (OSs), organizações da sociedade civil (OSCs) e oscips e não passam de empresas privadas, que substituem a administração pública e a contratação de profissionais pelo Estado. Várias possuem histórico de investigações e processos envolvendo fraudes, desvios e outros tipos de crimes.
No setor da saúde, essas “entidades”, quando não são instrumentos para corrupção com dinheiro público, servem como puro mecanismo para a terceirização dos serviços, o que resulta invariavelmente na redução dos salários e de direitos.
Embora seja mais visível na Saúde, isso ocorre em todas as áreas da administração pública, como Educação, Cultura e Assistência Social. O saldo para a sociedade é a má qualidade do atendimento, o desmonte do SUS, das demais políticas públicas e, pior ainda: o risco às vidas.
Todos estes anos de subfinanciamento do SUS e demais serviços essenciais, de desmantelamento dos direitos sociais, de aumento da exploração, acirramento da crise social, econômica e sanitária são reflexos de um modo de produção que visa apenas obter lucros e rentabilidade para os capitais. Mercantiliza, precariza e descarta a vida humana, sobretudo dos trabalhadores. O modelo de gestão por meio das Organizações Sociais e entidades afins é uma importante peça desta lógica nefasta e por isso deve ser combatido.
Não à Terceirização e Privatização dos serviços públicos!