O Hospital Israelita Albert Einstein vai assumir a gestão de três hospitais estaduais de São Paulo. A gestão dos equipamentos será realizada por meio da Organização Social de Saúde (OSS) ligada ao grupo privado. Tratam-se dos hospitais Darcy Vargas, Ipiranga e Heliópolis – todos considerados de referência para os municípios da região metropolitana da capital paulista em uma série de especialidades.
A notícia é mais um golpe ao Sistema Único de Saúde e à concepção de saúde pública universal e de qualidade. A ofensiva não é de hoje. Nos últimos anos, o Einstein, assim como outros gigantes do setor suplementar, ampliou sua participação no SUS, como traz o site Outras Palavras, dentro da Coluna Outra Saúde:
“O Observatório Anahp chama atenção para o fato de que o grupo israelita já administra mais leitos públicos que privados. Os recursos do SUS representam uma parcela cada vez maior do caixa deste hospital privado.
Por outro ângulo, a infiltração crescente das formas não-públicas de gestão na Saúde de São Paulo, especialmente através das OSs, também é uma tendência no governo de Tarcísio de Freitas. O caso recente do Hospital Estadual Sumaré, noticiado por Outra Saúde, é exemplar. Na prática, o governo estadual coagiu a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) a criar sua própria OS para que pudesse seguir à frente do equipamento, sob protestos da população atendida e da comunidade universitária.”
Além das três unidades, o Einstein já é responsável pela gestão de outros cinco hospitais públicos, sendo dois em São Paulo, dois em Goiás e um na Bahia.
A gestão de hospitais públicos estaduais por organizações sociais acontece por meio de parceria público privada que transfere para as empresas a responsabilidade de manter as unidades do SUS. Somente em 2024, R$ 19.236.482.709,81 foram transferidos do orçamento do Governo do Estado para essas entidades privadas. A tendência é que o valor seja ainda maior em 2025, pois somente no primeiro semestre o montante transferido para OSs já soma R$ 11.873.625.098,36. Os dados são do Tribunal de Contas do Estado (TCE-SP).
Nesse sistema, que os governos chamam de gestão compartilhada e os especialistas entendem como privatização não clássica, as OSs são pagas pela Secretaria de Saúde do Estado para ofertar o serviço gratuito à população. E é aí que está o problema. Empresas visam lucro e trabalhar com essa concepção em um sistema público é a grande contradição.
São muitos os exemplos que mostram que terceirizar os serviços significa fragilizar as políticas públicas, colocar a população em risco e desperdiçar recursos valiosos com ineficiência, má administração ou até má fé de entidades privadas.
Disfarçadas sob uma expressão que esconde sua verdadeira natureza, as organizações sociais (OSs), organizações da sociedade civil (OSCs) e oscips e não passam de empresas privadas, que substituem a administração pública e a contratação de profissionais pelo Estado. Várias possuem histórico de investigações e processos envolvendo fraudes, desvios e outros tipos de crimes.
No setor da saúde, essas “entidades”, quando não são instrumentos para corrupção com dinheiro público, servem como puro mecanismo para a terceirização dos serviços, o que resulta invariavelmente na redução dos salários e de direitos. Precarização que, ao contrário dos que os governos adeptos dessa modalidade dizem, só trazem a piora no atendimento e a dificuldade no acesso aos serviços.
Mesmo que formalmente continuem sendo públicas, os contratos com OSs funcionam por metas, planilhas e produtividade – indicadores que, muitas vezes, não refletem a complexidade do cuidado em saúde. O saldo para a sociedade é não só o desmonte do SUS, mas principalmente o risco às vidas.
Todos estes anos de subfinanciamento do Sistema Único de Saúde e demais serviços essenciais, de desmantelamento dos direitos sociais, de aumento da exploração, acirramento da crise social, econômica e sanitária são reflexos de um modo de produção que visa apenas obter lucros e rentabilidade para os capitais. Mercantiliza, precariza e descarta a vida humana, sobretudo dos trabalhadores.
O modelo de gestão por OSs e entidades afins é uma importante peça desta lógica nefasta e deve ser combatido.
Para o Sindicato dos Médicos de São Paulo (Simesp) a privatização da gestão dos hospitais públicos para Organizações Sociais de Saúde representa mais um ataque à saúde pública e ao funcionalismo, com graves consequências tanto para os profissionais da saúde quanto para a população usuária do Sistema Único de Saúde (SUS). Em uma moção de repúdio a entidade sindical deixa claro que a privatização da gestão hospitalar precariza os vínculos de trabalho e fragiliza a política pública de saúde, principalmente em áreas que demandam profissionais altamente qualificados.
“Para os servidores, as consequências são claras:
- Precarização do trabalho: profissionais terceirizados costumam receber salários menores, ter menos benefícios e ausência de garantias contratuais.
- Falta de estabilidade: contratos temporários aumentam o risco de demissões e reduzem a segurança no emprego.
- Impacto na carreira: a ausência de uma carreira estruturada e oportunidades de crescimento profissional desestimula os trabalhadores.
Além dos impactos para trabalhadores e trabalhadoras, a população também sofre diretamente com questões como:
- Qualidade dos serviços: a ausência de controle rigoroso e fiscalização adequada pelas OSs pode comprometer o atendimento.
- Falta de continuidade: a alta rotatividade de profissionais dificulta o vínculo entre pacientes e equipe médica, prejudicando o cuidado integral.
- Acesso aos serviços: a lógica de gestão privada pode aprofundar desigualdades no acesso à saúde pública.
- Desafios na fiscalização: o controle social e institucional sobre empresas terceirizadas é mais difícil, dificultando a identificação e correção de falhas.
“A privatização da gestão na saúde pública tem consequências complexas e variadas, afetando tanto os servidores quanto os pacientes. Quando se trata de serviços de alta complexidade, a situação é ainda mais alarmante. A terceirização pode gerar riscos na qualidade dos serviços, com menor continuidade no cuidado e maior dificuldade em garantir a qualidade da assistência”, explica a diretora do Simesp, Juliana Salles.