
Cícera Marques Alcântara, de 56 anos, moradora de Santos, faleceu no dia 8 de outubro no Hospital dos Estivadores após sofrer nove paradas cardíacas. A família acredita que a evolução do quadro para tromboembolismo pulmonar bilateral poderia ter sido evitada e critica o tratamento recebido nas inúmeras consultas nas UPAs da Cidade e por fim, a demora na transferência para uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI).
Segundo Silene Marques da Silva, filha de Cícera, a mãe frequentemente procurava as Unidade de Pronto Atendimento (UPAs) Central e da Zona Noroeste, devido a pressão alta e cardiomegalia, mas era sempre liberada. Ambas as UPAs são gerenciadas pela organização social Insaúde, que têm inúmeras denúncias de mau atendimento e de irregularidades no histórico. Cícera também sofria de dores abdominais causadas por uma hérnia.
Depois de ir e voltar das UPAs nos dias 20 de agosto e 30 de setembro, no dia 5 de outubro, Cícera deu entrada na UPA da Zona Noroeste com intensa falta de ar, sendo entubada e diagnosticada com água no pulmão. A família iniciou então uma corrida por uma vaga em UTI, essencial para o tratamento. Após quatro dias internada na UPA, Cícera foi transferida para o Hospital dos Estivadores no dia 8.
Ao Jornal A Tribuna, Silene relatou que a mãe começou a passar mal ainda na ambulância e, ao chegar ao hospital, sofreu nove paradas cardíacas. “Minha mãe já chegou passando mal”, desabafou a filha, lamentando a perda precoce de sua mãe e a sensação de que o desfecho poderia ter sido diferente.
Em nota, a Secretaria Municipal de Saúde de Santos informou que o pedido de vaga em UTI para Cícera, que necessitava de suporte para diálise, foi feito à 0h33 do dia 6 de outubro. A solicitação foi encaminhada tanto aos hospitais do SUS no município quanto ao sistema Siresp do Estado. A vaga no Complexo Hospitalar dos Estivadores foi disponibilizada no final da manhã do dia 8.
A Tribuna entrou em contato com a INSaúde, organização que administra as UPAs de Santos. Em nota, ela disse:
Em relação à paciente C.M.A., D.N.: 24/09/1969, após apuração via sistema MV – Prontuário Eletrônico do Paciente, seguem as informações referentes aos atendimentos realizados:
• 1ª passagem: em 20/08/2025, na UPA Central, com hipótese diagnóstica de Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) e Diabetes Mellitus (DM). Conduta: administração de medicação na unidade, alta com prescrição médica, orientações gerais e recomendação de retorno em caso de piora do quadro clínico.
• 2ª passagem: em 30/09/2025, também na UPA Central, com hipótese diagnóstica de HAS. Conduta: realização de exame de raio X, administração de medicação na unidade, prescrição para uso domiciliar e orientação para retorno se necessário, bem como seguimento ambulatorial para investigação complementar.Já na UPA Zona Noroeste, a paciente foi atendida em 20/08/2025 e, posteriormente, em 05/10/2025, quando deu entrada pela sala de emergência, sendo classificada com prioridade vermelha e atendida em tempo zero, conforme protocolo institucional.
Durante o atendimento, foram realizados todos os procedimentos indicados ao quadro clínico apresentado e, após avaliação médica criteriosa, o profissional assistente registrou o caso no Sistema de Regulação Municipal, solicitando vaga de UTI diante da gravidade observada, em conformidade com o fluxo estabelecido pela Secretaria Municipal de Saúde.
Após análise do prontuário, verificou-se que todas as condutas médicas foram técnica e cientificamente embasadas, em estrita observância às diretrizes assistenciais, protocolos institucionais e literatura médica vigente. A paciente foi transferida em 08/10/2025 para hospital de segmento terciário, conforme regulação e indicação clínica.
Complexo Hospitalar dos Estivadores
Em nota enviada para A Tribuna, o Complexo Hospitalar dos Estivadores, gerenciado por outra OS – o Instituto Social Hospital Alemão Oswaldo Cruz – lamentou “o falecimento da paciente mencionada e informa que ela foi admitida em UTI Adulto do Complexo Hospitalar dos Estivadores às 14h07m, de 8 de outubro, em parada cardíaca, trazida por equipe de transporte inter-hospitalar. Após o atendimento realizado no interior do hospital, a paciente apresentou retorno da circulação espontânea, seguida de novo quadro de instabilidade, evoluindo a óbito 98 minutos depois da sua chegada”.
CONTRA TODAS AS FORMAS DE TERCEIRIZAÇÃO E PRIVATIZAÇÃO!
Como se vê, terceirizar os serviços é fragilizar as políticas públicas, colocar a população em risco e desperdiçar recursos valiosos com ineficiência, má administração ou até má fé de entidades privadas.
Disfarçadas sob uma expressão que esconde sua verdadeira natureza, as organizações sociais (OSs), organizações da sociedade civil (OSCs) e oscips e não passam de empresas privadas, que substituem a administração pública e a contratação de profissionais pelo Estado. Várias possuem histórico de investigações e processos envolvendo fraudes, desvios e outros tipos de crimes. No setor da saúde, essas “entidades”, quando não são instrumentos para corrupção com dinheiro público, servem como puro mecanismo para a terceirização dos serviços, o que resulta invariavelmente na redução dos salários e de direitos.
Embora seja mais visível na Saúde, isso ocorre em todas as áreas da administração pública, como Educação, Cultura e Assistência Social. O saldo para a sociedade é a má qualidade do atendimento, o desmonte do SUS, das demais políticas públicas e, pior ainda: o risco às vidas.
Todos estes anos de subfinanciamento do SUS e demais serviços essenciais, de desmantelamento dos direitos sociais, de aumento da exploração, acirramento da crise social, econômica e sanitária são reflexos de um modo de produção que visa apenas obter lucros e rentabilidade para os capitais. Mercantiliza, precariza e descarta a vida humana, sobretudo dos trabalhadores. O modelo de gestão por OSs e entidades afins é uma importante peça desta lógica nefasta e deve ser combatido.