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REPORTAGEM DE ‘OS INCONFIDENTES’ MOSTRA EMENDA DO VEREADOR PASQUARELLI (UNIÃO) PARA BENEFICIAR SUA PRÓPRIA IGREJA EM PLC QUE VISA ALTERAR LEIS URBANÍSTICAS
Foi publicada nesta quinta, um dia após liminar judicial suspender as mudanças na legislação urbanística de Santos, uma reportagem do site Os Inconfidentes que ilustra bem como o interesse público e o direito à Cidade é colocado de lado para beneficiar os interesses políticos e religiosos de alguns parlamentares.
Segue abaixo a matéria na íntegra, publicada pelo jornalista Carlos Ratton. Para ler direto na página do veículo clique aqui.
ZEIS Santos (SP): vereador coloca ainda mais ‘em xeque’ legitimidade do projeto suspenso pela Justiça
O presidente da Comissão de Desenvolvimento Urbano e Habitação Social da Câmara de Vereadores de Santos, vereador Rafael Pasquarelli Matos (União), pode ter colocado ainda mais ‘em xeque’ a legitimidade do Projeto de Lei Complementar 27/2025 cuja tramitação foi suspensa pela Justiça, na última quarta-feira (10) a pedido da Defensoria Pública de Santos.
O PLC 27/2025 previa alterações na Lei de Uso e Ocupação de Solo (LUOS) da Área Insular (1.187/22); Plano Municipal de Mobilidade e Acessibilidade Urbanas (1.087/19) e Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS) de 15 de maio de 1992.
Em seu perfil, publicado no site da Câmara de Vereadores, Pasquarelli revela que é coordenador do Movimento Cristão de Conscientização Política na Baixada Santista, ligado a várias vertentes evangélicas da região.
Mas, coincidência, ou não, a emenda aditiva 18 (o projeto tem 38), que altera o artigo 16 da Lei Complementar 1.087/19, pede a supressão da implantação da Passagem 31 (P31) que corta o terreno da Igreja Cristo é Resposta.
A P31 é de Renovação Urbana está garantida no Plano Municipal de Mobilidade e Acessibilidade Urbana de Santos (Lei 1.087/19), em vigor e inédito no Brasil, que garante diversas outras passagens na cidade. A P31 viabilizaria acesso entre as avenidas Washington Luís e Senador Feijó, na no bairro da Vila Mathias.
A supressão da P31 iria acabar com a obrigação legal da igreja, em caso de expansão construtiva superior a 30% de seu imóvel, de abrir um acesso urbano, permitindo o trânsito livre de qualquer cidadão ou cidadã, evangélico (a) ou não.
Os Inconfidentes percebeu a forma ‘discreta’ que a supressão foi colocada no PLC 27/2025. Não há outras passagens semelhantes também suprimidas, somente a da igreja localizada em ponto importante da cidade. Santos já perdeu quatro passagens.
Mobilidade
O arquiteto urbanista e professor universitário José Marques Carriço (foto) considera que a retirada da Passagem 31 é mais um ataque ao Plano de Mobilidade, comprometendo toda uma rota de acessibilidade urbana nele definido a aprovado por lei. “Santos precisa de mais passagens e não de mais muros!”, alerta.Carriço explica que as passagens conectam várias quadras e são importantes para pedestres poderem ‘furar’ o bairro ao meio sem trânsito, para ciclistas transitarem com segurança, para cadeirantes evitarem obstáculos urbanos.
“É mobilidade ativa. Ela evita, até, que a Prefeitura gaste dinheiro com desapropriações em caso de expansão da malha viária. Além disso, os imóveis programados com as passagens de renovação urbana tem incentivos previstos. Ou seja, não incentivar passagens é um equívoco até econômico”.
Caminhabildade
O artigo 67 da Lei de Mobilidade Urbana explica que as passagens definidas no Plano Diretor do Município têm como objetivo a caminhabilidade urbana a partir da criação e preservação de percursos de livre acesso ao público conectando logradouros e facilitando a circulação intrabairros ou entre regiões.Elas garantem o uso público de toda a área da passagem no mínimo das 7 às 20 horas, sem qualquer cercamento ou dispositivos de controle de acesso ao espaço, assim como sem qualquer estrangulamento horizontal ou vertical de suas aberturas durante o período de uso público.
No caso da P31 (renovação urbana), ela teria que ter seis metros de largura e sete de pé direito, com possibilidade de espaços de transparência em seu trajeto. Veja o número de passagens de renovação previstos no plano na imagem que ilustra o post
Vereador
Na última quarta-feira, a Reportagem de Os Inconfidentes procurou o vereador Rafael Pasquarelli Matos. Ele foi encontrado numa reunião de vereadores logo após a Justiça ter determinado a suspensão da sessão que possibilitaria a tramitação do PLC 27/2025.“Eu penso que a igreja é importante também na questão social, porque ela faz o trabalho com os moradores de rua, com o pessoal de organização, enfim, faz muito o projeto social que a Prefeitura deixa de fazer algumas vezes”.
Passada as explicações preliminares, ele começou a se mostrar embaraçado quando questionado sobre o porquê da supressão somente da P31 da proposta que poderia ser por conta de sua ligação com a comunidade evangélica por intermédio de uma coordenação Movimento Cristão de Conscientização Política na Baixada Santista, o que supostamente beneficiaria a Cristo é Resposta.
“O terreno é da igreja. [Coloquei a emenda] porque achei importante para a cidade e a comunidade da igreja. A passagem nunca teve. Aquela quadra sempre foi daquele jeito. E a igreja comprou o espaço e o espaço é dela. Você quer que tire a emenda? Quanto tempo está essa lei? Procura saber se a população ali ao redor quer aquela rua de passagem para ficar morador de rua. Eu sou contra o morador de rua. A população toda santista não gosta. Eu tenho certeza disso. Ah, com licença”, finalizou o parlamentar bastante irritado.
Justiça
Lembrando que a Defensoria Pública de Santos conseguiu uma liminar (decisão provisória) na Justiça determinando a imediata suspensão da tramitação do Projeto de Lei Complementar 27/2025, que estava prevista para ocorrer nesta quarta-feira (10), às 14 horas. O mandado de intimação foi encaminhado ao presidente da Casa, vereador Adilson Júnior (PP-foto), que esvaziou a sessão para discutir a liminar.O ponto mais sensível do PLC 27/2025 é o que poderia redefinir móveis localizados em Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS) e que enterraria definitivamente a possibilidade de famílias em vulnerabilidade morarem em áreas urbanas estruturadas, perto de trabalho, escola e todo o tipo de assistência de saúde e social, praticamente conduzindo-as à periferia e até palafitas.
A proposta era um verdadeiro ‘apito de cachorro’ para a especulação imobiliária. Ela foi aprovada em primeira discussão na terça-feira (9), contrariando audiências públicas, decisão do prefeito Rogério Santos (Republicanos) e, até, ‘driblando’ outra judicial (ver nesta reportagem). Foi capitaneada pela Comissão de Desenvolvimento Urbano e Habitação Social da Câmara e mudava vários artigos das leis complementares 1.187 e 1.087.
A questão mais polêmica foi recriação do artigo 152 da Lei de Uso e Ocupação do Solo (LUOS), revogada do texto original pelo Executivo, que não exigia aval da Câmara, bastando apenas comprovar o interesse público e a vantagem no cumprimento da política habitacional, além de passar pelo crivo dos conselhos -Desenvolvimento Urbano e Habitação – geralmente aparelhados.
Outros requisitos ainda descaracterizavam um dos maiores avanços da política habitacional de Santos, permitindo que grupos econômicos comprassem os imóveis que seriam para os mais pobres, como já ocorreu este ano.
Quem esteve na sessão de terça-feira viu uma verdadeira aberração. Praticamente dois parlamentares – Débora Camilo (PSOL) e Marcos Caseiro (PT) – e uma galeria repleta líderes comunitários e de movimentos pró-moradia tentando convencer, sem a menor chance, 17 outros (a) vereadores a mudarem o voto.
Eles, no entanto, mantiveram-se calados, com uma frieza pouco vista, num dos capítulos mais vergonhosos da história da Câmara. Ficou claro que muitos mal sabiam no que, na verdade, estavam votando. Nem os gritos de apelo das galerias e as faixas de alerta foram capazes se sensibilizá-los.
O vereador Benedito Furtado (PSB) não se manifestou como Débora e Caseiro, mas também votou contrário à proposta da Comissão, liderada pelo vereador Rafael Pasquarelli Matos (presidente-União) e que tem o vereador Edivaldo Fernandes Menezes (Chita – PSB) como vice. O vereador Chico Nogueira (PT), o terceiro membro da comissão, não esteve presente à sessão mas foi contrário ao parecer dos dois colegas de plenário. Ele deve agir ainda esta semana.