CADASTRE-SE PARA RECEBER NOSSAS NOTÍCIAS

AUMENTO DA TARIFA TEM AFOBAÇÃO EXECUTIVA, DESPREZO LEGISLATIVO E SENTENÇA JUDICIAL

Tarifa300Enquanto a população amarga com um reajuste de mais de 18% na tarifa do transporte público, os vereadores de Santos devem estar sorrindo por dentro. Isto porque, tendo sido o aumento feito por decreto do prefeito, depois revisto pela Justiça, estão isentos de culpa e cobrança. Fora do mundo bizarro para onde se transferiu a questão, ou seja, no mundo normal, o aumento seria proposto por projeto de lei enviado à Câmara, para ser debatido e votado em sessões abertas ao público. Claro, ninguém duvida que o aumento seria aprovado pela maioria governista que diz amém a todos os projetos do prefeito. Mas, haveria o debate, com tempo para as “indesejáveis” manifestações populares. Certamente foi isso que se quis evitar.

Apesar de poupados, os vereadores farão o seu jogo de cena. O mais novo presidente do Legislativo, Adilson Jr (PTB, segundo mandato) anunciou a convocação de audiência pública para discutir o assunto, após o retorno do recesso, no início de fevereiro. Com a afobação do Executivo em conceder o aumento e agradar a concessionária, a Câmara foi atropelada em total desrespeito. O decreto do prefeito aumentou a tarifa em 8 de janeiro, em mais de 18%, de R$ 3,25 para R$ 3,85. Os R$ 0,60 representam mais de 300% sobre o índice da inflação do ano anterior e a elevação não condiz com o poder aquisitivo da população. Foi esta a avaliação da Defensoria Pública, do Ministério Público e da juíza da Segunda Vara da Fazenda de Santos, que reconheceu a ação como legítima. A magistrada acabou definindo a tarifa em, no máximo, R$ 3,45, que seria o resultado da aplicação da inflação do ano anterior (6,29%).

Para leitores e eleitores, o assunto virou um prato cheio. As redes sociais ficaram repletas de comentários. O santista Felipe Mattos ironizou o fato de o valor da tarifa do ônibus comum, de R$ 3,85, ser quase totalmente equiparada à tarifa dos seletivos. “Executivo seletista. Logo, torna o Legislativo uma chancelaria dispensável”. Marco Beletti colocou pingos nos is. “Governar por decreto? Não é isso que queremos. Os representantes do povo tem que levantar a voz…”.

Houve uma tese –infundada- de que a Câmara poderia derrubar o decreto do Executivo. Tal informação não procede. Pode a Câmara baixar um decreto legislativo, em se tratando de matéria legal aprovada em plenário e vetada pelo prefeito. Mas não em se tratando de decreto do prefeito. A expectativa então recaiu sobre a decisão da Justiça. O leitor Fábio Soliman deu o seu parecer. “Não vai dar em nada, até porque se derrubarem o decreto, o prefeito faz pela Câmara, e essa aprova sem maiores esforços”.

A opinião da leitora Jô Lima Alves deixou nítida a falta de preocupação deste governo com a população e a frieza em achacar o cidadão com reajustes elevados em período de crise econômica. “Meu imposto subiu mais de 37%. A prefeitura disse estar correto. Não consegui reclamar com os argumentos do atendente”. Claudio Avelino abordou uma questão profunda, de que os eleitos estão sempre ao lado do poder econômico e ou a fim de se locupletarem. “Na verdade as Câmaras de Vereadores só servem para enriquecer os distintos, só!”. George Wells apontou a falta de independência. “Tem vereador dizendo que não pode fazer nada. Se não tivesse o rabo preso já teria feito”.

Mesmo em recesso pelo menos três dos novos vereadores eleitos se manifestaram e disseram que vão questionar o reajuste. Fabrício Cardoso (PSB, primeiro mandato), Chico Nogueira (PT, primeiro mandato) e Telma de Souza (PT, segundo mandato) prometeram falar contra o reajuste. Telma não esperou a volta do recesso e pediu a planilha de custos à gestora CET. A fala do eleitor Douglas Barros Pinheiro Souza demonstra, com certa ironia, o que a população pensa sobre os custos do transporte. “Senhora vereadora, muito boa a sua solicitação à CET. Porém, sabemos que esta planilha NUNCA será entregue e a senhora ficará quatro anos esperando. É claro que nessa situação não há interesses ocultos entre permissionárias e autarquias”.

JUDICIALIZAÇÃO – Esta não é a primeira vez que algo corriqueiro na vida pública, como um aumento de tarifa, vai parar na Justiça. O fenômeno mostra o desarranjo em que vem se tornando as funções institucionais do Legislativo, do Executivo e do próprio Judiciário. E são várias as razões que levam a isso. Nenhuma delas é totalmente positiva, uma vez que a população santista, o maior dos interessados, não tem participação ativa no processo. Só para lembrar, as manifestações populares de 2012 e 2013, que foram estopim para atos em todo o país, tiveram início com um aumento de apenas vinte centavos, na tarifa do transporte em São Paulo.

Em Santos, o aumento considerado abusivo ainda rende ação por improbidade administrativa ao prefeito. Mais uma entre tantas. A judicialização vem se mostrando a última saída, já que existe total inoperância da Câmara quando se trata de se contrapor ou fiscalizar o Executivo. No caso específico da tarifa, ficou confortável para os vereadores governistas afirmarem que estão de “mãos atadas”. Porém, o mesmo se deu em outras questões ignoradas em plenário e que viraram processos, como o Programa Santos Novos Tempos, as denúncias de nepotismo, dos chequinhos, do escândalo da merenda, das contratações irregulares e outras. E há ainda, momentos em que o próprio Legislativo é o alvo da ação. Algumas delas: nepotismo, contratações irregulares e a locação de carros de luxo para os vereadores. Esta última também foi vetada em Vara da Fazenda Pública de Santos. As sentenças favoráveis à população, no entanto, não tornam desnecessárias as manifestações populares. Não se pode esperar que os juízes façam o papel que cabe ao cidadão consciente, crítico e participativo.