Um dos preceitos básicos para que uma Organização Social (OS) atue no gerenciamento de uma unidade ou de um serviço público é que não vise lucro. Pelo menos essa é a cantilena que os políticos amigos das terceirizações gostam de reproduzir. Afinal, as OSs são tidas como entidades de terceiro setor, embora sejam classificada como pessoa jurídica de direito privado.
Exatamente por esse motivo, os Tribunais de Contas não admitem que essas OSs embolsem a chamada taxa de administração. No entendimento do TCE-SP, taxa de administração é igual a lucro.
Não é o que pensa a OS Fundação ABC. Por cobrar da Prefeitura de Praia Grande essa taxa de administração no aditamento do contrato de terceirização do Hospital Municipal Irmã Dulce, em Praia Grande, o Tribunal julgou irregular o termo aditivo nº 15, firmado em novembro de 2011.
“É assente o entendimento nesta Corte de Contas sobre a ilegalidade desta cobrança, pois se configura como proveito econômico, figura em tudo estranha aos ajustes com o terceiro setor”, detalha em seu voto o substituto de conselheiro Alexandre Manir Figueiredo Sarquis, relator do processo no TCE-SP.
A taxa em questão é de 2% do valor de custeio mensal, fixado em R$ 1.838.553,00 à época. E sabemos que além desse dinheiro, as OSs lucram por meio dos altos salários que os membros da diretoria recebem. Mas isso é outra história…
Prefeitura não vê nada errado
O ex-prefeito, Roberto Francisco dos Santos, apresentou justificativas ao Tribunal alegando que a taxa de administração se fez necessária em vista de “(…) constar no Regimento Interno da Organização Social Fundação do ABC, entidade mantenedora, no seu Título III – Da Estrutura Orgânica – Artigo 8º – item V, referente às unidades mantidas o custo de 1% dos recursos financeiros recebido para utilização conforme disposições orçamentárias aprovadas pelo Conselho Curador.”
E que o outro 1% se destina ao custeio do aparato operacional destinado ao alcance das metas estabelecidas para adimplemento do contrato de gestão.Por causa da taxa administrativa, o termo aditivo 15 da Fundação ABC foi julgada irregular.
Os argumentos não convenceram o conselheiro Alexandre Sarquis e demais membros da Segunda Câmara do TCE que, no último dia 14/7, manteve a irregularidade da taxa de administração. Acesse o Acórdão.
Contas de 2011 também foram reprovadas
Em um outro processo mais recente, as contas do exercício de 2011 referente aos contrato com Fundação ABC também foram consideradas irregulares pelo mesmo motivo: cobrança de taxa de administração. Segundo o Tribunal de contas, a OS não conseguiu comprovar satisfatoriamente a regularidade de R$1.009.345,15 do montante total repassado naquele ano. Veja aqui o acórdão.
Ficha corrida
A Fundação ABC foi a escolhida pelo prefeito de Santos, Paulo Alexandre Barbosa (PSDB), para atuar na futura UPA, que substituirá o PS Central nos próximos dias.
Irresponsabilidade que será compartilhada com quem depende do atendimento, com os trabalhadores e com os contribuintes que pagarão os R$ 19 milhões para a empresa que já tem uma longa ficha corrida de irregularidades em outras cidades onde atua ou já atuou. Além disso, no próprio hospital Irmã Dulce, os problemas se multiplicam. O último deles teve a ver com a quarteirização dentro do equipamento. (funcionários da unidade ficaram sem almoço por atrasos no pagamento à empresa fornecedora de refeições).
Sistema organizado para lucrar às custas do SUS
As OSs nada mais são que empresas com redes de atuação muitas vezes bem organizadas e sofisticadas para lucrar burlando os mecanismos de controle de gastos em áreas públicas de diversas formas. Quase sempre atuam em vários municípios de mais de um estado da federação.
Conforme documento da Frente em Defesa dos Serviços Públicos, Estatais e de Qualidade, “OSs somente se interessam em atuar em cidades e em serviços onde é possível morder sobretaxas nas compras de muitos materiais e equipamentos e onde pode pagar baixos salários. O resultado é superfaturamento em todas as compras (o modelo dispensa licitação para adquirir insumos e equipamentos), a contratação sem concurso público de profissionais com baixa qualificação e, por vezes, falsos profissionais.
O dinheiro que é gasto desnecessariamente nos contratos com estas empresas sai do bolso do contribuinte, que paga pelos serviços públicos mesmo sem utilizá-los e acaba custeando o superfaturamento e os esquemas de propinas para partidos e apadrinhados políticos”.
Santos está caminhando nesta direção desde o final de 2013, quando o governo municipal criou o projeto de lei das OSs e os vereadores a transformaram em lei.
Para saber mais sobre esse verdadeiro golpe em andamento leia a cartilha Santos, Organizações Sociais e o Desvio do Dinheiro Público.