No último dia 19, o Governo de Santos publicou portaria abrindo sindicância administrativa contra a organização social Instituto Social Hospital Alemão Oswaldo Cruz (Ishaoc), a fim de apurar indícios de irregularidades nos termos aditivos de um contrato firmado com a própria Prefeitura.
A portaria, assinada pelo ouvidor público Rivaldo Santos, faz referência aos problemas apontados pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE-SP), conforme noticiou o Ataque aos Cofres Públicos no ano passado.
Clique aqui para ver a íntegra da matéria acima, publicada em julho de 2021.
O prazo para Comissão Permanente de Inquérito e Sindicância é até 13 de maio para apurar as supostas responsabilidades administrativas.
O acórdão foi publicado no último dia 17. No relatório do processo, o conselheiro Samy Wuman escreveu que a Pandemia COVID19 não é cheque em branco para repassar, sem critérios, valores às entidades do terceiro setor, sendo necessária, no mínimo, uma previsão estimada de atendimentos, de acordo com a sua capacidade operacional, nos leitos do Complexo Hospitalar dos Estivadores.
Outro ponto salientado é a impossibilidade, ainda que na situação pandêmica, de incluir um novo hospital para ser utilizado como Hospital de Campanha sob a gestão da OS.
E foi justamente o que a Prefeitura fez ao repassar para o Instituto o comando do Hospital de Campanha instalado no Hospital Vitória.
Estes acertos foram oficializados por meio de aditamentos ao contrato já em andamento com a OS. O 5º termo aditivo, de 28/04/2020, objetivou substituir o plano operativo anual, por um plano operativo emergencial – COVID19, no valor aproximado de R$ 18.803.052,83.
O 6º termo aditivo, de 22/5/2020, no valor de R$ 290.000,00 (recursos municipais), além de verbas federal e estadual, objetivou acrescentar em caráter excepcional e temporário o Anexo I – Plano Operativo Emergencial, adicionando o gerenciamento dos leitos do Hospital Vitória ao Plano Operativo Emergencial do Hospital dos Estivadores.
O 7º termo aditivo, de 21/10/2020, objetivou aditar o Contrato nº 365/2016 para: I- atualizar o Plano Operativo Anual (POA) através do Anexo I; IIProrrogar em caráter excepcional e temporário até 31 de dezembro de 2020 o Plano Operativo Emergencial (Leitos COVID CHE), objeto do 5º Termo de Aditamento nº 47/2020 – SMS, que integra o aditivo como Anexo II; III-Prorrogar em caráter excepcional e temporário até 31 de dezembro de 2020 o Plano Operativo Emergencial (Leitos Hospital Vitória), objeto do 6º Termo de Aditamento, que integra o presente aditivo como Anexo III.
A fiscalização apontou as seguintes ocorrências no 5º termo aditivo: i) a evolução do valor contratual demostra que houve superação do limite de 25% do valor inicial atualizado para acréscimos, chegando ao patamar de 79% e 67%, configurando violação à Lei nº 8.666/93, §§ 1º e 2º do art. 65, c/c art. 116; ii) ausência de estipulação de metas para os serviços específicos para enfrentamento ao COVID-19, no qual foi alocado repasse de R$ 17.591.494,83, caracterizando o descumprimento do art. 15, inciso I, da Lei municipal 2.947/2013; iii) Redução de metas e serviços foi desproporcional à supressão do repasse para custeio do contrato (R$ 1.193.510,00) caracterizando violação ao princípio da Eficiência insculpido no art. 37, caput, da CF/88, uma vez que reflete em falha de planejamento.
Quanto ao 6º e 7º termos aditivos, a fiscalização pontuou que o acréscimo de uma nova unidade de saúde, Hospital Vitória, estranha ao ajuste, desvirtua o objeto contratual, inexistindo, ainda, estipulação de metas, seja para o Complexo Hospitalar dos Estivadores, seja para o Hospital Vitória.
No acórdão, o auditor substituto de conselheiro Antonio Carlos dos Santos, o relator, e os conselheiros Dimas Ramalho (presidente), e Renato Martins Costa, a e. 2ª Câmara, em sessão de 06 de julho de 2021, mantiveram a regularidade do 5º Termo Aditivo. No entanto, foram julgados irregulares o 6º e o 7º Termos Aditivos. A corte ainda determinou que o prefeito Rogério Santos informe as providências administrativas complementares adotadas, comunicando, em especial abertura de sindicâncias.
Problemas anteriores
Esta não é a primeira vez que a gestão terceirizada do Hospital dos Estivadores de Santos enseja advertências à Prefeitura. Mostramos aqui no Ataque aos Cofres Públicos, no último dia 26 de junho, que a prestação de contas referente ao ano de 2018 também teve problemas. (veja aqui).
Dentre as inconsistências praticadas pelo Instituto Social Hospital Alemão Oswaldo Cruz e pela Prefeitura de Santos no exercício de 2018, estão:
- A maioria das metas ficou abaixo do esperado, revelando grande descompasso entre o planejado e o efetivamente executado, fato que vai de encontro ao princípio da eficiência;
- A Secretaria Municipal de Saúde não encaminhou o relatório da Comissão de Avaliação, em descumprimento ao art. 149, capute inciso XIX, das Instruções nº 02/2016 TCESP;
- Discrepâncias foram encontradas entre os livros de controle de frequência de funcionários e a memória de cálculo para pagamento;
- As demonstrações contábeis encaminhadas não estavam assinadas pelos responsáveis, violando o Art. 177, §4º da Lei nº 6.404/76;
- A Prefeitura não elaborou o termo de cessão de bens móveis, contrariando a Cláusula Terceira, item 4 do Contrato de Gestão;
- Em cumprimento parcial ao Artigo 2º e seu parágrafo único da Lei Federal nº 12.527/2011, a Organização Social não disponibiliza em seu sítio oficial da rede mundial de computadores todas as informações mínimas previstas no Artigo 8º da Lei de Acesso à Informação e no Comunicado SDG nº 16/20.
A Prefeitura e a OS enviaram justificativas ao TCE-SP, alegando que um dos problemas foi o atraso no repasse dos recursos prometidos pelo Governo do Estado para o custeio do hospital. O Instituto ainda informou que adotou ponto eletrônico para controlar a frequência dos profissionais e que está providenciando a publicação, em seu novo site em desenvolvimento, de todos os dados e informações exigidas pela Lei de Acesso à Informação.
Denúncias marcam OS
Aqui no Ataque aos Cofres Públicos já fizemos matérias mostrando familiares de pacientes atendidos no Hospital dos estivadores denunciando casos suspeitos de negligência e erro médico.
O mais recente foi publicado no site no último dia 15. A família de Clodualdo de Jesus, de 77 anos, conta que após ele ficar internado em dezembro, por 11 dias no Hospital, recebeu alta precocemente. Tanto que em casa piorou e teve de buscar atendimento na UPA da Zona Noroeste uma semana depois. Mais detalhes aqui.
Na mesma semana, só que no dia 13, mostramos também que uma moradora da Zona Noroeste de Santos, cujo pai estava internado no Hospital dos Estivadores, resolveu pedir ajuda no Facebook para preservar a vida do idoso.
Julyana Tavares Apolinário detalhou os motivos de sua preocupação na página Zona Noroeste.
Para ela, o tratamento dado a Antonio Marcos Apolinário foi insuficiente e só se agravou desde que ele deu entrada no hospital, em 23 de dezembro de 2019. A família conta que ele entrou andando, com queixas de dores fortes no lado esquerdo do peito, perto do ombro. Agora está totalmente debilitado, sem sequer conseguir comer sozinho.
A possibilidade de um princípio de infarto foi descartada. Para Julyana, houve uma remoção precipitada do pai da UTI para o setor de clínica médica. Além disso, só duas semanas depois de ingressar no Hospital os médicos descobriram que o marca passo do pai está contaminado e que seria necessária uma cirurgia.
E a demora ocorreu apesar da família ter avisado sobre a existência do marca passo no primeiro dia de internação. Até o último dia 13, ela aguardava pela operação de retirada do dispositivo. Mas essa cirurgia só poderia ser feita na Santa Casa de Santos.
Logo que foi selecionada para gerenciar o Hospital Municipal, a OS Instituto Social Hospital Alemão Oswaldo Cruz foi questionada na Justiça por não ter a experiência mínima de três anos, exigida em lei municipal. Na época em que foi qualificada como OS, a empresa tinha sido criada há 14 meses e não possuía no currículo nem mesmo um dia de gestão em serviço público.
Abaixo listamos mais matérias envolvendo denúncias de ineficiência na gestão do Hospital dos Estivadores pela OS Instituto Social Hospital Alemão Oswaldo Cruz:
OS que comanda Estivadores não cumpre todas as metas no Hospital
Mãe que perdeu bebê no Hospital dos Estivadores pede investigação criminal no Ministério Público
Mãe relata drama após ter seu bebê no Hospital dos Estivadores
Gestantes denunciam práticas na Maternidade dos Estvadores
Pai vai à imprensa para denunciar falta de estrutura no Hospital dos Estivadores
Hospital dos Estivadores: advogado entra com representação criminal contra OS e Prefeitura
Mais um parto traumático no Hospital dos Estivadores, em Santos
Terceirizar sai mais caro e é mais arriscado
Estudo publicado em 2018 por várias universidades chegou à conclusão de que as Organizações Sociais custam 2,4 vezes mais caro do que a administração direta, sem garantir ganho em eficiência.
Saiba mais nos links abaixo:
SISTEMA FRAUDULENTO ORGANIZADO PARA LUCRAR ÀS CUSTAS DO ESTADO
Ocips e Organizações Sociais (OSs), ONGs e outros tipos de entidades “sem fins lucrativos” recebendo dinheiro público nada mais são que empresas com redes de atuação (muitas vezes bem organizadas e sofisticadas) para lucrar burlando os mecanismos de controle de gastos em áreas públicas e fraudando o estado. Quase sempre atuam em vários municípios de mais de um estado da federação.
Conforme documento da Frente em Defesa dos Serviços Públicos, Estatais e de Qualidade, “OSs e oscips somente se interessam em atuar em cidades e em serviços onde é possível morder sobretaxas nas compras de muitos materiais e equipamentos e onde pode pagar baixos salários. O resultado é superfaturamento nas compras (o modelo dispensa licitação para adquirir insumos e equipamentos), a contratação sem concurso público de profissionais com baixa qualificação e, por vezes, falsos profissionais.
O dinheiro que é gasto desnecessariamente nos contratos com estas empresas sai do bolso do contribuinte, que paga pelos serviços públicos mesmo sem utilizá-los e acaba custeando o superfaturamento e os esquemas de propinas para partidos e apadrinhados políticos”.
No meio desta pandemia, além do medo de se contaminar e contaminar assim os seus familiares, profissionais da saúde enfrentam também a oferta despudorada de baixos salários e falta de estrutura de trabalho, o que contrasta com a importância da atuação deles no combate ao COVID-19.
É evidente que o saldo para a sociedade é a má qualidade do atendimento, o desmonte do SUS e, pior ainda: o risco às vidas.
Todos estes anos de subfinanciamento do SUS, de desmantelamento dos demais direitos sociais, de aumento da exploração, acirramento da crise social, econômica e sanitária são reflexos de um modo de produção que visa apenas obter lucros e rentabilidade para os capitais. Mercantiliza, precariza e descarta a vida humana, sobretudo dos trabalhadores. O modelo de gestão da Saúde por meio das Organizações Sociais é uma importante peça desta lógica nefasta e por isso deve ser combatido.
Não à Terceirização e Privatização da Saúde Pública! Em defesa do SUS 100% Estatal e de Qualidade!