O Ministério Público de São Paulo (MPSP) divulgou a abertura de inquérito civil para investigar o atendimento prestado a Jamily Vitória Duarte, de 5 anos, que morreu após uma picada de escorpião, em Piracicaba (SP), em 12 de agosto deste ano.
O procedimento foi aberto após a Promotoria receber denúncia de que a criança morreu por falta de atendimento adequado na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) da Vila Cristina.
A Promotoria informou que enviou ofícios à Delegacia Seccional de Polícia Civil, Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp) e Conselho Regional de Enfermagem do Estado de São Paulo (Coren-SP) e aguarda o envio de respostas a questionamentos feitos.
Anteriormente, o Ministério Público já tinha solicitado o envio de documentos e informações da administração municipal e da Organização Social de Saúde (OS) que administra a unidade. Com o recebimento dos documentos e informações, a Promotoria vai avaliar se há indícios de que houve negligência ou imperícia por parte dos responsáveis pelo atendimento de Jamily.
O Coren-SP informou que recebeu a denúncia do Ministério Público e abriu sindicância para investigação da eventual participação de profissionais de enfermagem. “A apuração seguirá sob sigilo processual e, após a averiguação dos fatos, se forem constatados indícios de infração ética, será instaurado um processo ético-profissional”, acrescentou.
Segundo o conselho, os profissionais eventualmente envolvidos poderão ser notificados para manifestar a sua versão do fato, garantido o direito de defesa.
“As penalidades previstas na Lei 5.905/73, em caso de confirmação da infração são: advertência, multa, censura, suspensão temporária do exercício profissional ou cassação do exercício profissional pelo Conselho Federal de Enfermagem”, finalizou.
Já o Cremesp comunicou que foi acionado pela Promotoria e que está investigando o caso.
A Prefeitura de Piracicaba, por meio da Corregedoria, informou em nota que segue com a apuração do caso por meio de sindicância interna que, quando finalizada, terá seu resultado divulgado.
“A Secretaria de Saúde informa que segue todos os protocolos de atendimento exigidos pela Secretaria de Estado da Saúde, sempre de acordo com as recomendações vigentes”, apontou.
Já a Associação Mahatma Gandhi, que administra a UPA, informou em nota que tão logo tomou conhecimento do fato iniciou uma sindicância para apurar o ocorrido.
Também apontou que, devido ao grande número de profissionais envolvidos no atendimento direta ou indiretamente e a realização de oitiva individual de todos, ainda não foi possível concluir a apuração.
“Afirmamos que prontamente após finalizada a sindicância aqueles que forem encontrados responsáveis, medidas disciplinares e punitivas cabíveis serão aplicadas”.
Entenda o caso
Mãe de Jamily, Patrícia das Graças Adriana Duarte relatou que a filha chegou à UPA no dia 11, um dia antes da morte, gritando de dor, e ela informou imediatamente na recepção que a menina havia sido picada por escorpião – o fato ocorreu na frente da casa do avô. De acordo com a mãe, se tratava de um escorpião amarelo.
Ela também afirmou que depois de mais de uma hora recebeu a informação de que não havia o soro na unidade – a menina acabou transferida pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) até a Santa Casa, onde teria recebido a medicação, mas o quadro já havia se agravado.
“Ela chegou gritando, desesperada. Todo mundo ficou paralisado. Disse que era picada [de escorpião], mas foram pegando meus dados com maior calma. Se tivessem falado logo que não tinham o soro, eu teria ido para a Santa Casa com minha filha”, disse.
“Quando ela chegou na Santa Casa, foi difícil achar a veia dela. E ela foi piorando. Lá pelas 2h da madrugada, ela piorou, começou a dar parada cardíaca, e veio a óbito por volta das 8h”, contou a mãe.
De acordo com o site oficial da prefeitura de Piracicaba, o procedimento adotado pela mãe é o recomendado. A Secretaria de Saúde orienta, em caso de picada de escorpião, que a população procure a UPA mais próxima.
“Quando existe uma sintomatologia mais grave é dado o primeiro atendimento na UPA e, caso ocorra a necessidade, o paciente é encaminhado à Santa Casa de Pìracicaba, referência em administração do soro antiescorpiônico em nossa região”, diz o texto atribuído à coordenadora das Urgências e Emergências, Flávia de Sá Molina.
Prefeitura diz que havia soro
Dois dias após a morte de Jamily, a Prefeitura de Piracicaba afirmou que a UPA tinha soro antiescorpiônico, mas que não foi aplicado na menina porque ela estava desidratada, o que dificultava o acesso. “Como a Santa Casa tem uma estrutura de referência, [as equipes] optaram por bem levá-la diretamente à UTI”, explicou o secretário de Saúde, Douglas Yugi Koga.
O chefe da pasta também afirmou que todos os detalhes do atendimento estão sendo apurados pelos responsáveis para dar uma resposta à família da menina.
A prefeitura também informou que o atendimento à menina teve início às 20h47 pela triagem e 21h03 com atendimento médico. “Tendo em vista a gravidade do caso, encaminhou-a para sala vermelha com objetivo de estabilização do quadro clínico”, diz um trecho da nota oficial.
“Foram tomadas as medidas iniciais de suporte clínico para estabilização e solicitada imediatamente a vaga para UTI Pediátrica junto à Santa Casa de Misericórdia, onde deu entrada às 22h45 diretamente na UTI, levada pelo Samu.”
Já a Secretaria de Estado da Saúde também informou que havia soro na UPA e que apura o motivo da transferência.
CONTRA TODAS AS FORMAS DE TERCEIRIZAÇÃO E PRIVATIZAÇÃO!
Como se vê, terceirizar os serviços é fragilizar as políticas públicas, colocar a população em risco e desperdiçar recursos valiosos com ineficiência, má administração ou até má fé de entidades privadas.
Disfarçadas sob uma expressão que esconde sua verdadeira natureza, as organizações sociais (OSs), organizações da sociedade civil (OSCs) e oscips e não passam de empresas privadas, que substituem a administração pública e a contratação de profissionais pelo Estado. Várias possuem histórico de investigações e processos envolvendo fraudes, desvios e outros tipos de crimes.No setor da saúde, essas “entidades”, quando não são instrumentos para corrupção com dinheiro público, servem como puro mecanismo para a terceirização dos serviços, o que resulta invariavelmente na redução dos salários, de direitos e baixa qualificação de profissionais.
Embora seja mais visível na Saúde, isso ocorre em todas as áreas da administração pública, como Educação, Cultura e Assistência Social. O saldo para a sociedade é a má qualidade do atendimento, o desmonte do SUS, das demais políticas públicas e, pior ainda: o risco às vidas.
Todos estes anos de subfinanciamento do SUS e demais serviços essenciais, de desmantelamento dos direitos sociais, de aumento da exploração, acirramento da crise social, econômica e sanitária são reflexos de um modo de produção que visa apenas obter lucros e rentabilidade para os capitais. Mercantiliza, precariza e descarta a vida humana, sobretudo dos trabalhadores. O modelo de gestão por meio das Organizações Sociais e entidades afins é uma importante peça desta lógica nefasta e por isso deve ser combatido.
Não à Terceirização e Privatização dos serviços públicos!