O prefeito de Sorocaba (SP), Rodrigo Manga (Republicanos), e dois ex-secretários, Vinicius Rodrigues, que foi secretário da Saúde, e Fausto Bossolo, da administração, são investigados pelo Ministério Público.
O Gaeco do sul apura denúncias de irregularidades na contratação de uma organização social que também administra duas unidades de Saúde de Sorocaba. Os contratos que somam mais de R$ 100 milhões.
A investigação apura contratos para gerenciamento da Unidade de Pronto Atendimento do Éden (UPA), já encerrado, e para administração da Unidade Pré-Hospitalar da zona oeste (UPH Oeste), ainda em vigor.
De acordo com reportagem do G1 e da TV TEM documentos de uma investigação do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Rio Grande do Sul trazem elementos, obtidos via interceptação telefônica e quebra de sigilo de mensagens, de que a relação entre os investigados e a OS começou antes mesmo da eleição de 2020 e teria sido realizada diretamente por Manga. Os documentos já estão com promotores de Sorocaba.
Linha do tempo
No dia 13 de setembro de 2020, o partido Republicanos, ainda com a sigla de PRB, fez sua convenção municipal em um hotel de Sorocaba e oficializou Rodrigo Manga como candidato à prefeitura.
10 dias depois, em 23 de setembro, uma conversa entre integrantes da OS Aceni cita a candidatura e demonstra o desejo de apoiar financeiramente a campanha de Manga.
Os diálogos foram obtidos com exclusividade pela reportagem e fazem parte da Operação Copa Livre, realizada pelo Gaeco do RS em 2022, que tinha a empresa como um dos alvos. Leia abaixo:
“Vamos decidir amanhã as cidades em que a gente vai, porque que estou te falando isso, o João marcou para segunda-feira no PRB, com o cara de Sorocaba, o cara de Sorocaba vai ganhar, é aquele cara que já esteve com a gente, todo mundo já me falou desse cara aí e o cara tá no PRB, o cara vai ganhar a eleição. O João já marcou no partido, inclusive, para tentar fazer até uma situação melhor pra nós, marcou para segunda-feira.”
Nove meses depois, com Rodrigo Manga já eleito prefeito, em junho de 2021, os integrantes da organização social trocam novas mensagens. O áudio cita que um dos membros da OS havia acabado de sair de uma reunião com o então secretário de Saúde de Sorocaba, o médico Vinícius Rodrigues.
Na conversa, o secretário teria afirmado que o Instituto Diretrizes teria perdido um serviço de saúde na cidade e desejava que a Aceni assumisse de forma emergencial. Há, ainda, nos documentos uma menção de valor: “o secretário já adiantara que ele estaria pensando em uns 20 por mês”.
No caso, segundo a investigação, seriam R$ 20 mil por mês para fechar o contrato.
O diálogo da reunião ocorrida em Sorocaba continua e, em determinado momento, é informado que o prazo para entrega das propostas terminaria no dia seguinte, às 23h, e que Fausto Bossolo – se referindo ao ex-secretário de Administração de Sorocaba da época – iria ligar para eles até 22h, com a intenção de passar o valor para a Aceni ganhar.
Após o ocorrido, a Aceni venceu e assumiu dois serviços de saúde no município. Primeiro em 2021, na gestão emergencial da UPA do Éden, um contrato de seis meses de duração que já foi encerrado.
Em março de 2022, a Aceni venceu o contrato da administração da UPH da zona oeste, antes administrada pelo Instituto Diretrizes. Este contrato ainda está em vigor.
Juntos, os dois contratos consumiram R$ 101 milhões dos cofres da Prefeitura de Sorocaba, sendo R$ 15 milhões na UPA do Éden e R$ 86 milhões na UPH zona oeste.
Operação Copa Livre
A Operação Copa Livre foi realizada no dia 31 de março de 2022. O Gaeco cumpriu 81 medidas cautelares contra 24 pessoas e 15 empresas no Rio Grande do Sul, São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. O promotor responsável disse, na época, que havia um núcleo empresarial praticando fraudes em todo o Brasil na área da Saúde.
De acordo com o Gaeco, os investigados entregaram grande quantidade de dinheiro ilícito a vários candidatos nas eleições municipais de 2020, firmando acordos e compromissos, antes e depois das eleições, com a intenção de fechar futuros contratos fraudados na área de atuação da organização social Aceni e empresas parceiras. Um dos exemplos citados no documento é o de Sorocaba, sendo a troca de gestão da UPA do Éden.
O Gaeco do RS cita Sorocaba em sua investigação para evidenciar a prática de outros ilícitos e crimes no curso das eleições de 2020, por parte da organização social. De acordo com o MP gaúcho, os integrantes da Aceni entregaram grande quantidade de dinheiro ilícito para vários candidatos, com objetivo de obterem contratos fraudados após a eleição. A referência de Sorocaba é citada na página 173.
“No caso, estavam a falar do candidato conhecido como Rodrigo Manga, que, de fato, venceu a eleição e, agora, em julho de 2021, provavelmente cumprindo, portanto, o acordo criminoso feito com os investigados, contratou por seis meses a entidade Aceni, do investigado Paulinho, para administrar e gerir a UPA do Éden, na cidade, ao custo de R$ 2,4 milhões por mês.”
Os documentos do Gaeco foram encaminhados ao promotor Eduardo Francisco Junior, em Sorocaba, e farão parte do inquérito para apurar possível improbidade administrativa na contratação da Aceni na cidade.
Outras duas investigações estão em andamento com a promotoria da área da Saúde e analisam os serviços prestados pela entidade em Sorocaba na UPA do Éden e na UPH da zona oeste.
O que dizem os investigados
A Prefeitura de Sorocaba e o prefeito Rodrigo Manga afirmaram, por meio de nota, que não são investigados nesse caso e não têm conhecimento do teor do processo.
“Aliás, o prefeito Rodrigo Manga nunca em sua história autorizou que alguém falasse em seu nome. Todos os processos e licitações sempre acontecem dentro das normas legais, com acompanhamento dos órgãos internos de controle e fiscalização da administração municipal de Sorocaba.”
Os ex-secretários Fausto Bossolo e Vinícius Rodrigues não responderam aos questionamentos enviados pela reportagem.
A Aceni também foi questionada. Em nota, disse que tem conhecimento da investigação, tem prestado os esclarecimentos solicitados pelos órgãos e colaborado com as investigações. Disse também que não houve desvio de recursos públicos e que Paulo Sirqueira Korek Farias e Sylvio Mauro Pereira tiveram contratos suspensos com a instituição em maio de 2022.