Gerido pela organização social Associação Filantrópica Nova Esperança (AFNE), o Hospital Bela Vista, fechado em novembro do ano passado após a morte de cerca de 30 pacientes entre agosto e setembro, não apresentou laudo de vistoria dos bombeiros à fiscalização e tinha licença de operação vencida, de acordo com o documento da Vigilância Sanitária obtido pela reportagem da Folha Press.
Entre as irregularidades, a vigilância encontrou uma licença incompatível e vencida da Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb) e não ter tido acesso ao auto de vistoria do Corpo de Bombeiros.
A AFNE nega e alega que a documentação foi “devidamente entregue no momento da fiscalização” e que possui auto de vistoria dos Bombeiros com validade até julho de 2026.
Sem ventilação
A unidade de saúde fazia atendimento à população em situação de rua desde 2020 e a AFNE era responsável por administrá-la. Em 2020, a prefeitura a contratou para gerir 43 centros de saúde na região central de São Paulo. Entre eles, o Bela Vista.
No quinto andar, funcionava a ala para pacientes com tuberculose. Segundo a Vigilância Sanitária, no local não havia sistema de ventilação e isolamento, o que comprometia a “saúde dos demais pacientes” e funcionários.
Desde 2002, a Anvisa determina o isolamento para o tratamento de infectados por tuberculose, uma doença respiratória contagiosa e transmitida por via respiratória.
A inspeção encontrou objetos sujos e limpos guardados nas mesmas áreas, o que comprometeria a esterilização, e o centro cirúrgico desativado, “não ficando claro o local onde são realizados os procedimentos invasivos”. Já os exames eram feitos à “beira-leito”, segundo os agentes.
As avaliações foram enviadas ao Ministério Público de São Paulo, que investiga as irregularidades e as mortes.
Em nota, a Secretaria Municipal da Saúde afirma que o Bela Vista possui auto de vistoria válido dos Bombeiros e que os “pacientes que necessitavam de continuidade no tratamento foram transferidos para outros hospitais da rede municipal” por determinação do MP.
Após o hospital ser lacrado, a prefeitura negou irregularidades. Depois, voltou atrás e fechou o hospital Bela Vista sem previsão de reabertura.
No Bela Vista, trabalhavam cerca de 500 profissionais. Em novembro, todos foram demitidos por decisão de Ricardo Nunes (MDB). “É dinheiro público. Não posso ficar pagando funcionários”, afirmou o prefeito na ocasião das demissões. Em dezembro, profissionais da saúde protestaram em frente à prefeitura para reativação dos serviços.
ORGANIZAÇÃO FOI ENVOLVIDA EM INVESTIGAÇÃO FEDERAL
Em 2020, a gestão Nunes contratou a AFNE mesmo após o Ministério Público Federal incluí-la em uma investigação de desvio de dinheiro público e uso de laranja no Rio de Janeiro.
Na ocasião, a prefeitura paulistana calculou um repasse de R$ 335 milhões anuais para a organização administrar os mais de 40 hospitais na capital. O contrato está vigente.
Após a reportagem da Folha de S.Paulo sobre o caso, o MP de São Paulo incluiu o inquérito federal nas investigações estaduais.
Em nota, a SMS afirmou que o processo de “contratação respeitou os princípios de transparência, eficiência e ética na gestão dos recursos públicos” e que “apresentou toda a documentação exigida em edital e comprovação de capacidade técnica.”
Já a AFNE afirma seguir “todas as medidas inerentes à segurança e saúde dos pacientes” e que a investigação do MPF se tratava de “acusações genéricas” que não resultaram em ação contra os diretores da organização voltada à área de saúde.
CONTRA TODAS AS FORMAS DE TERCEIRIZAÇÃO E PRIVATIZAÇÃO!
Terceirizar os serviços é fragilizar as políticas públicas, colocar a população em risco e desperdiçar recursos valiosos com ineficiência, má administração ou até má fé de entidades privadas.
Disfarçadas sob uma expressão que esconde sua verdadeira natureza, OSs, organizações da sociedade civil (OSCs) e oscips e não passam de empresas privadas, que substituem a administração pública e a contratação de profissionais pelo Estado. Várias possuem histórico de investigações e processos envolvendo fraudes, desvios e outros tipos de crimes. No setor da saúde, essas “entidades”, quando não são instrumentos para corrupção com dinheiro público, servem como puro mecanismo para a terceirização dos serviços, o que resulta invariavelmente na redução dos salários e de direitos.
Embora seja mais visível na Saúde, isso ocorre em todas as áreas da administração pública, como Educação, Cultura e Assistência Social. O saldo para a sociedade é a má qualidade do atendimento, o desmonte do SUS, das demais políticas públicas e, pior ainda: o risco às vidas.
Todos estes anos de subfinanciamento do SUS e demais serviços essenciais, de desmantelamento dos direitos sociais, de aumento da exploração, acirramento da crise social, econômica e sanitária são reflexos de um modo de produção que visa apenas obter lucros e rentabilidade para os capitais. Mercantiliza, precariza e descarta a vida humana, sobretudo dos trabalhadores. O modelo de gestão por meio das Organizações Sociais e entidades afins é uma importante peça desta lógica nefasta e por isso deve ser combatido.
Não à Terceirização e Privatização dos serviços públicos!