Inadmissível que tenha sido preciso que um bebê morresse à espera de um resgate que demorou 15 horas para as autoridades de saúde entenderem que o modelo de gestão do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), terceirizado para uma Organização Social (OS), precisa ser urgentemente revisto.
Foi o que aconteceu em Santa Catarina. O bebê que faleceu é da cidade catarinense de Mafra. Conforme noticiou a imprensa nas últimas semanas, a família da criança teve que esperar mais de 15 horas pelo resgate porque não havia gasolina na viatura com UTI disponível do Samu. O problema não foi de ordem financeira. A OS não estava com repasses em atraso. No desespero para salvar a filha, os pais chegaram a implorar para eles mesmos pagassem pela gasolina da viatura. De nada adiantou.
Leia aqui a entrevista com os pais da criança.
Mudança
Na última terça (4), depois de nomear um novo gerente de fiscalização do Samu no Estado, a Secretaria de Saúde apresentou, durante coletiva de imprensa em Florianópolis, a prévia de como deve funcionar o novo modelo do serviço no Estado.
Prevista para ser implementada somente em dezembro, a proposta do governo estadual é integrar o Samu com o Corpo de Bombeiros e centralizar todas as operações dos dois órgãos em uma única estrutura. No entanto, o projeto ainda deve passar pelo Conselho de Secretários, Comissão Intergestora e o Conselho Estatual de Saúde – formado por usuários do Sistema Único de Saúde (SUS).
O Samu, gerido atualmente pela Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina (SPDM), opera hoje com oito centrais regionais de atendimento e custa R$ 9 milhões ao mês. Com as mudanças, o governo estadual pretende economizar quase R$ 2 milhões. De acordo com o responsável pela integração, o tenente-coronel dos Bombeiros João Batista Cordeiro Júnior, o estudo realizado dentro das duas instituições desde o início do ano demonstrou que há falhas em ambas instituições. E, com o fim do contrato com SPDM, “houve a necessidade de modernizar e ampliar” o serviço.
A fala é uma maneira de não dizer claramente o que todos já sabem: A Organização Social SPDM custou bem mais caro aos cofres públicos de Santa Catarina e foi INEFICIENTE quando mais se precisou dela. Isso custou uma vida. E será mesmo que foi só uma?
Mesmo com o modelo ainda em debate, a Secretaria garantiu que a ideia do novo projeto é consertar os erros dos últimos anos.
A morte do bebê em Mafra está sendo investigada pelo Ministério Público (MP), segundo a superintendente de Serviços Especializados e Regulação, Karin Geller.
“A gente já discutia (a reformulação), mas a morte do bebê foi o estopim para a gente ter certeza de que não pode ficar como está. Por uma série de dificuldades do passado, a SPDM assumiu toda a responsabilidade, mas o serviço tem que voltar a ser comandado pela secretaria e por órgãos e profissionais da saúde”, disse Karin.
Os pais da criança, fizeram um B.O. no dia em que ela morreu, relatando que o motivo da demora para o resgate foi a falta de combustível na UTI móvel do Samu que levaria a menina de um hospital a outro. Alexandro Lisboa e Edilaine Mathias consideram que houve descaso na transferência da filha. A menina faleceu após sofrer três paradas cardiorrespiratórias.
“Diziam que tinha médico, tinha tudo, menos o combustível. Então eu dizia ‘me ajude, é a vida da minha filha, ela está quase indo embora, está quase sem respirar. Se for por falta de combustível, vamos colocar’. Eu implorando ali na frente da ambulância parada e eles diziam que não podia”, contou o pai.
SindiSaúde defende criação de consórcio público para atendimento de urgência
Apesar de entender que a situação da saúde no Estado é crítica, o Sindicato dos Trabalhadores da Saúde de Santa Catarina (SindSaúde) é contra a proposta e teme a continuidade da terceirização por meio de uma outra organização social, ainda que o modelo mude. Para os SindiSaúde, as OSs no Samu precarizam o Serviço, pois a lógica mercadológica com que é encarada a assistência em saúde permanece.
“A nossa posição é contrária à integração. O sindicato acredita que isso é um retrocesso e pode precarizar ainda mais o trabalho. O que temos defendido é que se forme um consórcio público para o atendimento do Samu e se abra um concurso público”, disse uma das dirigentes da categoria, Eloísa Helena Pereira.