No último dia 10/12 fez exatos dois anos que um dos escândalos mais pavorosos envolvendo corrupção em Organizações Sociais de Saúde (OSS) vieram à tona.
Duas entidades que no papel eram classificadas como sem fins lucrativos foram pegas literalmente com a mão no dinheiro que deveria estar sendo investido na melhoria do serviço. Elas foram investigadas pelo desvio de cerca de R$ 10 milhões por ano da área da saúde, segundo investigações do Ministério Público.
O caso foi tema de extensa reportagem no Fantástico. Quase R$ 1 milhão em dinheiro vivo foi encontrado num apartamento em Higienópolis, área nobre de São Paulo, durante operação deflagrada pelo Ministério Público de Sorocaba (SP).
No local foram apreendidos R$ 952 mil, 8 mil euros, US$ 3.200 e 1 mil pesos argentinos e chilenos. As malas de dinheiro foram encontradas na casa de Fabio Berti Carone, apontado como comandante do esquema de desvio de recurso. Dez pessoas foram presas na operação. “Aquele era um dinheiro que deveria ser aplicado na saúde pública”, afirmou na época o promotor Luiz Fernando Guinsberg Pinto.
Dando nomes aos bois, as organizações flagradas praticando as irregularidades e desvios foram Sistema Assistencial à Saúde (SAS) e Instituto SAS. Ambas eram responsáveis pela gestão de hospitais em Itapetininga, São Miguel Arcanjo, Americana, Araçariguama e Vargem Grande Paulista, além do Rio de Janeiro e de Araranguá, em Santa Catarina. As entidades faziam a gestão e o governo pagava a conta. O governo e cada um dos munícipes, via impostos.
Funcionava assim: o SAS e instituto SAS comprava insumos e medicamentos e a conta apresentada às prefeituras era maior que os valores realmente gastos. A apuração revelou que, embora constituídos na forma de organizações não-governamentais independentes uma da outra, o SAS e Instituto SAS se confundiriam em uma única organização criminosa, administrada e comandada pelo mesmo líder.
Os contratos somavam R$ 100 milhões por ano. De acordo com as investigações, 10% do valor dos contratos eram desviados. Ou seja, R$ 10 milhões por ano não iam para a Saúde. “A finalidade era desviar verbas públicas através da emissão de notas frias e contratos superfaturados”, disse o delegado Wilson negrão.
Já o promotor do caso, Luiz Fernando Guinsberg Pinto , afirmou: “A investigação demonstrou que o único objetivo de Fabio Berti Carone à frente do SAS era desviar recursos públicos em proveito próprio”.
Nesta semana, a polícia prendeu Fabio Carone e outras nove pessoas suspeitas de envolvimento com os desvios de dinheiro. Todas foram soltas.
Escutas telefônicas
Na investigação escutas telefônicas incriminavam o dono das entidades. Um funcionário comentou a propina de 10% para Fabio. “A hora que eu mostrei pra ele a conta, um milhão e duzentos, que eu achei que ele ia ficar contente, falei assim, um milhão e duzentos, ele tem dez, né? É… Então, cento e vinte pau”, relata o funcionário.
Em outra ligação, uma funcionária cita uma reportagem do Fantástico sobre fraudes em hospitais. “É a ética do mercado, entendeu? O mercado pratica 10%. Se eu ganho 1 milhão e 300, dou 130. É o normal”, afirma.
Até o prefeito de Americana participou da farra
A investigação demonstrou provas de o prefeito e o secretário de Saúde também estavam envolvidos e receberam propina de R$ 100 mil. O prefeito de Americana rechaçou as acusações. “Não, isso é inverdade. Isso é uma mentira. É um absurdo, não existe. Não existiu e nem nunca vai existir”, afirmou Diego de Nadai. Ele confessou ter encontrado Fábio, “mas nunca pra tratar nada referente a negociata”.
Da mesma forma, o secretário de Saúde, Fabio Bordon, negou as falcatruas. “Eu tenho total tranquilidade em afirmar que não tive nenhum recebimento de qualquer favor em meu benefício em razão desse contrato com o Instituto SAS”, afirmou.
Itapetininga
O Ministério Público também fez investigações em Itapetininga e chegou à conclusão de que lá entidade desviava dinheiro desde 2007. Depois das prisões, o hospital voltou a ser gerenciado pela prefeitura.
Outras prefeituras
As prefeituras de Araçariguama, São Miguel Arcanjo, Vargem Grande Paulista, Rio de Janeiro, além do Hospital Regional de Araranguá, vinculado à Secretaria de Estado da Saúde de Santa Catarina também foram citados na investigação. Na época, as primeiras prefeituras de Araçariguama e Rio negaram qualquer irregularidade. A prefeitura de São Miguel Arcanjo alegou que as metas da entidade estavam sendo cumpridas. Por último, a de Vargem Grande Paulista disse que iria notificar a organização.
Santa Catarina
Até julho do ano passado, o Ministério Público de Santa Catarina, continuava investigando os desvios de dinheiro do SUS e aguardava diversos relatórios e documentos da Secretaria de Estado da Saúde de Santa Catarina. Dentre esses documentos, estava o resultado da sindicância feita pela pasta no Hospital de Araranguá, que inclusive identificou a necessidade da SAS devolver dinheiro aos cofres públicos.
A promotora responsável pelo caso solicitou as informações por várias vezes e, como não obteve resposta, apelou à Procuradoria Geral de Justiça, para que as solicitações fossem endereçadas diretamente ao governador do Estado. Hoje o Hospital é gerenciado por outra OSS. É a SPDM -Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina.