Como agem os genocidas da saúde

Como agem os genocidas da saúde

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O que você vai ler agora é muito, muito sério. Trata-se de um perfil detalhado que o Ministério Público Federal de Minas Gerais (MPF/MG) fez do que seria um genocida com um mandato municipal nas mãos.

O alvo da acusação é o prefeito de Montes Claros/MG, Ruy Adriano Borges Muniz (PRB). Ele é acusado de reter ilegalmente mais de R$ 20 milhões em verbas do SUS para favorecer seu próprio hospital. Pelo menos 1,6 milhão de pessoas de uma região de 86 municípios onde Montes Claros é polo metropolitano, teriam sido diretamente prejudicadas com um verdadeiro descalabro na saúde que, na visão do MPF, ocorreu propositalmente.

Quando o Ataque aos Cofres Públicos usa o termo “mercadores da vida” para se referir aqueles que lucram dilapidando o SUS, sejam eles gestores públicos, empresários da saúde ou mesmo servidores corruptos, é a esse tipo de situação que estamos nos referindo. Neste caso, o Ministério Público tem conseguido reunir indícios e provas para tentar responsabilizar os criminosos. Em muitos casos, no entanto, tudo acontece sem qualquer fiscalização e a impunidade impera.

É importante frisar que quem visa lucro, como ocorre com os grupos privados da saúde e as organizações sociais, não pode ser responsável pela gestão administrativa e financeira de unidades de saúde públicas. É totalmente contraditório, inclusive ao que reza a Constituição Federal que diz que saúde é um direito de todos (não só aos que podem pagar) e um dever do Estado.

Saiba mais lendo a cartilha Santos, Organizações Sociais e o Desvio do Dinheiro Público.

Esta história absurda de Montes Claros é um retrato do que significam os mercadores da vida em pele de prefeitos, secretários de saúde, empresários da saúde, diretores de OSS. E para entender um pouco mais recomendamos a leitura na íntegra a notícia do próprio MPF/MG:

 

 

MPF/MG: prefeito é acusado de reter ilegalmente mais de R$ 20 milhões em verbas do SUS

 

O Ministério Público Federal em Minas Gerais (MPF/MG) ingressou com ação de improbidade administrativa contra o prefeito de Montes Claros/MG, Ruy Adriano Borges Muniz. Também são réus na ação dois secretários de saúde municipais: a atual, Ana Paula de Oliveira Nascimento, e o antigo ocupante da pasta, Geraldo Edson Souza Guerra.

Eles são acusados de reter indevidamente mais de 20 milhões de recursos destinados à área da saúde, sem apresentar qualquer justificativa idônea para tais atos, prejudicando, com isso, mais de 1,6 milhão de pessoas e instaurando o caos na saúde pública do Norte de Minas. As condutas do prefeito e de seus secretários tiveram reflexos em toda a região, porque o município de Montes Claros é polo-referência para ações e serviços de saúde de média e alta complexidade da Macrorregião Norte, que é integrada por 86 municípios.

Na prática, o fato de Montes Claros ser a cidade polo da Macrorregião Norte significa que, quando um morador de qualquer dos 86 municípios precisar de atendimento de média e alta complexidade, ele deverá ser encaminhado à rede conveniada do SUS nessa cidade. Para viabilizar o atendimento, a Secretaria Estadual de Saúde (SES) encaminha os recursos necessários – de origem federal e estadual – ao Fundo Municipal de Saúde de Montes Claros, que, por sua vez, os direciona aos prestadores de serviços de saúde remunerando-os pelos atendimentos prestados.

No entanto, desde que o atual prefeito Ruy Muniz assumiu o poder público municipal, sem qualquer respaldo em fatos ou na legislação, sua administração vem retendo ilegalmente verbas federais e estaduais do SUS que deveriam ser encaminhadas aos prestadores de serviços hospitalares filantrópicos (Hospitais Aroldo Tourinho, Dílson Godinho e Santa Casa de Misericórdia) e público (Hospital Universitário).

Para isso, ele se vale do auxílio dos secretários municipais de saúde, que apenas referendam suas decisões. “Rigorosamente todos os atores públicos e privados envolvidos nas tratativas e no impasse das retenções ilegais dos recursos federais e estaduais do SUS destinados aos prestadores hospitalares, desde o início da atual gestão municipal, foram categóricos no sentido da completa ausência de autonomia dos Secretários de Saúde, que simplesmente acatam as ordens impositivas do Prefeito Ruy Muniz”, relata o MPF.

Em setembro de 2013, após audiência pública que contou com a presença de prefeitos e secretários de saúde dos municípios que integram a Macrorregião Norte, o prefeito e o então secretário Geraldo Edson foram notificados “a proceder a devolução imediata de todos os recursos financeiros retidos”, sob pena de responsabilização administrativa, cível e criminal.

Em vão. Diante do caos instalado na saúde pública da região, decorrente das ações ilegais do prefeito, os MPs Federal e Estadual expediram recomendação à União e ao Estado de Minas Gerais para que os repasses aos prestadores de serviços fossem regularizados, por meio da transferência direta dos recursos, sem passar pelo Fundo Municipal de Saúde de Montes Claros. Foi pedida ainda, além da instauração de Tomada de Contas Especial, a imediata devolução da totalidade dos recursos retidos pela Prefeitura, que, naquela época [setembro de 2013], já ultrapassavam os R$ 14,5 milhões de reais só em valores devidos aos hospitais filantrópicos, sem contar as retenções em desfavor do Hospital Universitário.

A recomendação foi acatada pelo governo estadual, com a edição de três deliberações que retiravam do Fundo Municipal de Saúde de Montes Claros a gestão dos recursos destinados aos programas Rede Cegonha, PRO-HOSP e Rede de Resposta à Urgência e Emergência.

Porém, no mês de fevereiro de 2014, Ana Paula Nascimento dirigiu-se à Comissão Intergestores Bipartite do SUS, afirmando a regularização de todos os recursos para os prestadores de serviço. Diante das informações, que eram falsas, as deliberações anteriores foram revogadas, sem que a CIB-SUS/MG tomasse o cuidado de verificar se de fato correspondiam à realidade.

As retenções ilícitas das verbas da saúde perduraram, e, em fevereiro deste ano, o MPF e o MP/MG solicitaram novamente a intervenção da Secretaria Estadual de Saúde. Desta vez, a SES determinou a realização de auditoria no Fundo Municipal de Saúde de Montes Claros, que acabou por confirmar todos os ilícitos, levando a CIB-SUS/MG a propor a estadualização da gestão dos hospitais da cidade.

Na semana passada, 14 de julho, o MPF e o MP/MG expediram nova recomendação – a terceira – para que o Ministério da Saúde e a Secretaria de Estado da Saúde adotassem as providências legais para fazer cessar a conduta ilegal dos réus.

Finalmente, em 15 de julho, a recomendação foi acatada e decretada a suspensão do repasse de verbas da saúde, federais e estaduais, ao Fundo Municipal de Saúde de Montes Claros a partir do dia 1º de setembro.

Prejuízos no atendimento à saúde – Segundo a Secretaria de Estado de Saúde (SES/MG), o montante total do débito da Prefeitura de Montes Claros com os prestadores de serviços hospitalares estaria atualmente em torno de R$ 20 milhões de reais, em valores retidos ilicitamente desde o início de 2013.

“O mais grave de toda essa situação é ver que a maior parte desses recursos destinava-se a ações e serviços de urgência e emergência, potencializando, assim, risco sanitário à vida das pessoas”, afirma o MPF.

A retenção dos recursos gerou imensos prejuízos concretos à assistência à saúde da população. O Hospital Universitário, por exemplo, que é uma unidade 100% SUS e, portanto, tem nesses recursos públicos sua única fonte de custeio, afirmou que a retenção ilegal das verbas vem ocasionando o desabastecimento de insumos e medicamentos, superlotação, aumento do índice de infecção hospitalar e aumento dos pedidos de desligamento de profissionais da saúde.

Essa realidade se repete nos demais hospitais, que ainda se viram obrigados a assumir empréstimos bancários para pagar as dívidas, deixando-os à beira da completa bancarrota e consequente fechamento.

O Hospital Dilson Godinho chegou a detalhar objetivamente os danos causados pela retenção indevida das verbas pela Prefeitura de Montes Claros aos pacientes de Oncologia, Nefrologia e Cardiologia, que necessitam de internação, entre eles, adiamento das internações, ineficácia do tratamento por falta de medicamentos e materiais e cancelamento ou adiamento de procedimentos cirúrgicos de pacientes internados.

Interesse pessoal – De acordo com a ação, “A real motivação dos abusos e ilegalidades ora questionados consiste – segundo provas e indícios constantes nos autos – em estratégia do Prefeito RUY MUNIZ para estrangular financeiramente os hospitais locais, com o deliberado propósito de inviabilizar sua existência e seu funcionamento, total ou parcialmente, para favorecer o recém-inaugurado hospital de seu grupo econômico (Hospital das Clínicas Dr. Mário Ribeiro da Silveira, ou Ambar Saúde, de natureza privada e fins lucrativos), direta ou indiretamente, pela assunção de valiosos procedimentos da alta e da média complexidade do SUS, pela cooptação dos melhores profissionais de saúde, pela polarização dos fornecedores de insumos, etc”. Diversos depoimentos foram colhidos neste sentido, inclusive de autoridades públicas locais.

Ruy Muniz inaugurou o Hospital Ambar Saúde em julho de 2013, quando já era prefeito de Montes Claros, mas fez questão de dizer, em informe publicitário da SOEBRÁS/FUNORTE então divulgado na mídia regional: “felicidade, é o que estou sentindo agora, de realizar um sonho de poder construir um hospital maravilhoso para entregar Montes Claros no aniversário da cidade”.

Entre as provas da tentativa de prejudicar os hospitais “concorrentes” para favorecer sua própria instituição hospitalar, consta uma ata da reunião de mediação da SES/COSEMS, realizada no último dia 08 de julho, em que Ruy Muniz, falando como prefeito de Montes Claros, impôs as seguintes condições para resolver o impasse da saúde de Montes Claros: que fossem “remanejados” cerca de R$ 2 milhões de reais dos hospitais locais para o Ambar Saúde; que a União e o Estado de Minas Gerais investissem mais R$ 2 milhões em recursos novos na saúde da macrorregião, sendo que este valor seria destinado exclusivamente ao hospital Ambar Saúde; e que fossem retirados os procedimentos de média complexidade dos hospitais Santa Casa, Aroldo Tourinho e Dílson Godinho. Na mesma reunião, Ruy Muniz teria demonstrado agir como “gestor de fato” do Ambar Saúde, ao dizer que este hospital não manteria suas propostas de metas físicas se não fossem atendidas suas condições.

Tentativa de distorção dos fatos – A ação ainda registra que desde o início da retenção das verbas, o prefeito tem se valido do “pretexto de que estaria a combater a corrupção nos hospitais de Montes Claros” para confundir a Justiça, os órgãos de fiscalização e controle e a opinião pública.

Frequentemente ele afirma que suas ações visam combater o pagamento por serviços não prestados, assim como obrigar os hospitais a melhorarem suas estruturas físicas. O MPF argumenta que todo serviço prestado pelos hospitais é previamente autorizado pela própria Secretaria Municipal de Saúde e que o município não possui qualquer gestão sobre os recursos destinados a incrementos e melhorias nos hospitais.

A própria Operação Desiderato, realizada em junho deste ano pelo MPF e Polícia Federal, foi usada por Ruy Muniz para distorcer os fatos, lançando intensa campanha na mídia regional para dizer que os ilícitos teriam sido “denunciados” pela Prefeitura de Montes Claros e que as prisões, buscas e apreensões confirmariam as acusações dele contra os prestadores hospitalares.

Segundo o MPF, tais alegações não procedem. Primeiro, porque, “antes ou depois da Operação Desiderato, nem o Prefeito Ruy Muniz nem qualquer de seus subordinados (os corréus Ana Paula e Geraldo Edson ou outros) jamais procuraram o Ministério Público Federal (PRM-MOC) ou a Polícia Federal (DPF-MOC) para apresentar quaisquer indícios ou evidências mínimas de envolvimento concreto da administração dos hospitais locais”, destaca a ação. Em segundo lugar, do que foi apurado até o momento, os crimes envolveram, de um lado, a indústria farmacêutica e de órteses e próteses, e, de outro, médicos que utilizam tais produtos e equipamentos, não havendo provas do envolvimento direto dos hospitais.

Pedidos da ação – Para o MPF, além da condenação nas sanções da Lei de Improbidade Administrativa, os réus devem ser condenados também por dano moral coletivo, na medida em que seus atos causaram prejuízos imensuráveis a mais de 1,6 milhão de pessoas, de 86 municípios, num período que se estendeu por mais de dois anos.

Por isso, considerando todas as variáveis envolvidas – essencialidade dos bens jurídicos envolvidos [vida, saúde, integridade física e psíquica da população], dimensões demográficas e geopolíticas da lesão, extensão temporal da lesão, recalcitrância dos ilícitos e os interesses pessoais e econômicos do prefeito, além de seu elevadíssimo poder financeiro, o MPF pediu que a Justiça Federal condene-o ao pagamento de indenização no valor de 15 milhões de reais.

Os secretários municipais de saúde, se condenados, podem ter de pagar indenização por dano moral coletivo no valor de R$ 1,5 milhão cada um.

Clique aqui para ter acesso ao conteúdo integral da ação

 

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