Os servidores do quase centenário Instituto Nacional de Tecnologia (INT), uma Instituição Pública, Federal, ligada ao Ministério de Ciência e Tecnologia e Inovação (MCTI), estão apreensivos com a ofensiva do capital nesta área tão estratégica para o desenvolvimento do país.
A mesma preocupação é compartilhada pelos participantes de sindicatos fóruns de representação de Servidores da Área de Ciência, Tecnologia e Inovação, que assistem a tentativa de transformação do INT e de outras unidades de pesquisa do MCTI em Organizações Sociais (OSs).
São vários as perdas dessa mutação do patrimônio construído em anos de desenvolvimento científico e tecnológico pelo Estado, a favor do povo brasileiro, em patrimônio exclusivo de entidades de direito privado que servirão como fonte de lucro para pequenos grupos.
Confira abaixo o que está em jogo, no texto compilado pelo Blog do JCR, com a contribuição de vários servidores da área.
ORGANIZAÇÕES SOCIAIS (OS) – Estudo e Visão Crítica
A Lei 9637/98 estabelece que o Poder Executivo poderá qualificar como (OS´s) pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, cujas atividades sejam dirigidas ao ensino, à pesquisa científica, ao desenvolvimento tecnológico, à proteção e preservação do meio ambiente, à cultura e à saúde.
Em outras palavras, esta Lei instituiu o Programa Nacional de Publicização, que autoriza o Poder Executivo, por meio da qualificação de entidades privadas como Organizações Sociais, a transferir-lhes a gestão de bens e serviços públicos. Em resumo significa que os recursos entram públicos. Do povo. Dos nossos impostos e saem privados (publicizados, palavra bonita…) em troca de uma pretensa eficiência, que a princípio o Estado reconhece não poder alcançar. Ou seja, abre mão de ele próprio buscar a eficiência em prol da Sociedade e utiliza o viés mais fácil: terceirizar as suas responsabilidades, com bônus para o privado e, em tendo a OS cumprido seu papel, também bônus para o público, mas ônus caso ela preste um mal serviço ou fracasse. A cobrança de metas pactuadas, como toda boa cobrança vem depois.
Assim, as OS´s são entidades de direito privado que, por iniciativa do Poder Executivo, obtêm autorização legislativa para celebrar Contrato de Gestão com esse Poder, e assim ter direito à dotação orçamentária. Nesse modelo, os gestores tomam decisões sobre o uso dos recursos públicos e prestam contas ao Estado, por meio de metas e indicadores de desempenho firmados no contrato de gestão, cuja vigência varia de OS para OS, não havendo necessidade de recorrer a procedimentos característicos da gestão pública, como licitações ou concursos públicos. Ou seja, a conquista de toda a Sociedade com o advento do Concurso Público como única forma de ingresso permanente ao Serviço Público cai por terra, abrindo espaço para que haja a ocorrência dos vícios vividos no passado, onde o “apadrinhamento” era a regra e a “competência e qualificação eram exceções”. Um retrocesso. A sociedade não pode pactuar com isso.
Uma OS na sua negociação com o Governo pode agir corretamente ou pode propor, pactuar, metas simples, fáceis de serem alcançadas e orçamento estratosféricos para alcançar essas metas. Isso é perfeitamente possível de ocorrer. No final, nessa premissa, não haveria a mínima eficiência em prol da Sociedade. Seria uma transferência pura e simples do dinheiro da Sociedade para poucos indivíduos privados. Os donos das OS´s, isto é, a presidência e o seu conselho de administração. Nós não podemos aceitar esse risco. Essa crença de que todos são bem intencionados e bonzinhos. Além do mais o modelo das OS´s hoje disseminado em um governo Neodesenvolvimentista é uma verdadeira aberração. Uma negação às princípios do Neodesenvolvimento. Esse Modelo foi gestado no âmbito do Neocapitalismo. Uma visão econômica totalmente antagônica, onde o mote era o Estado Mínimo. Isso é uma afronta a todos os segmentos sociais de esquerda, progressistas e nacionalistas que não aceitam mais que se repita a dilapidação do patrimônio público, como ocorreu de forma nefasta na era Fernando Henrique Cardoso. Naquela época só houveram falácias, inverdades e entreguismo. A adoção desse modelo no atual governo dá no mesmo. É uma negação à mudança histórica proposta quando da eleição do ex-presidente Lula.
Para os servidores de Insitututos de Pesquisa Governamentais, Universidades, Museus e ouros, o perigo é um fato. Quando o Poder Executivo qualificar a empresa privada sem fins lucrativos como OS, o órgão da Administração Pública Direta que for transformado será automaticamente extinto no mesmo Ato de formação da nova Organização, e esta, por meio de concessão de cessão especial, poderá utilizar a mão de obra dos servidores, com ônus para o Poder Público de origem. Ou seja, o servidor cedido permanecerá percebendo apenas as vantagens do cargo em extinção que tinha anteriormente, independentemente dos valores que venham a ser pagos aos empregados da organização social, e se esta acaso vier a ser extinta a lei não esclarece a destinação daqueles servidores estatutários que não quiserem aderir ao novo regime jurídico privado.
Como é possível de ser percebido pelo exposto, apesar de esta lei, vigente desde 18.05.1998, ter tido a constitucionalidade colocada em cheque por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn) 1.923, em abril de 2015, em sessão plenária, o (STF) decidiu pela validade da prestação de serviços públicos não exclusivos por OS´s em parceria com o poder público, dando interpretação conforme a Constituição às normas que dispensam licitação em celebração de contratos de gestão firmados entre o Poder Público e as organizações sociais para a prestação de serviços públicos de ensino, pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico, proteção e preservação ao meio ambiente, cultura e saúde.
Assim, por votação majoritária, a Corte julgou parcialmente procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn) 1923, para dar interpretação conforme a Constituição não apenas às normas que dispensam a licitação para a celebração de contratos de gestão firmados entre o Poder Público e as organizações sociais para a prestação de serviços de ensino, pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico, proteção e preservação ao meio ambiente, cultura e saúde – art. 24, XXIV, Lei 8666/93 -, como também o relator estendeu essa dispensa às próprias OS quando celebrarem contratos com terceiros, com a utilização de recursos públicos, desde que observem os princípios do caput do artigo 37 da CF/88 e os “termos do regulamento próprio a ser editado por cada entidade”, por considerar que por pertencerem ao terceiro setor as organizações sociais possuem natureza jurídica privada. Sendo assim, não estão sujeitas “a um vínculo de controle jurídico exercido pela Administração Pública em suas decisões”, porém, pelo fato de receberem recursos, bens e servidores públicos e não estarem “sujeitas às regras formais” do aludido artigo 37, dentre as quais da licitação, deverão apenas observar o “núcleo essencial dos princípios” ali definidos, “dentre os quais se destaca a impessoalidade”.
Assim, o STF ressalta a permissão para a NÃO licitação quando o poder público for “escolher” a entidade particular para estabelecer o contrato de gestão, o que pode ser usado para atender a “favores”, o que poderá fortalecer as ações de troca de favores, chamadas de “coalizão”.
Ora, é possível de se perceber que a interpretação dada pelo Supremo de acintosamente tornar prescindível a necessidade da licitação e do concurso público ignorou categoricamente o disposto no art. 2o da Lei 8666/93, que dita que “As obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações, concessões, permissões e locações da Administração Pública, quando contratadas com terceiros, serão necessariamente precedidas de licitação, ressalvadas as hipóteses previstas nesta Lei”, aproveitando-se da brecha feita pela Lei 9648/98, pela introdução do inciso XXIV, no art. 24 da Lei 8.666/93 – durante o governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso – ao dispensar de licitação “para a celebração de contratos de prestação de serviços com as organizações sociais, qualificadas no âmbito das respectivas esferas de governo, para atividades contempladas no contrato de gestão”, e ainda deu aos dirigentes das organizações sociais o direito de “legislar” sobre o regime que pretenderem adotar para a contratação de pessoal.. A contratação poderá ser, caso a OS deseje, pelo Regime Celetista, pelo Sistema de Bolsistas, como Servidores Temporários – baseado na Lei 8.745/93, Art. 2o, Inciso VIII – ou até mesmo pela criação de um “novo regime sui generis”, a depender apenas “da conveniência e oportunidade” quanto aos critérios que os gestores da OS desejarem adotar para tanto.
Dessa forma, pode-se deduzir que essa lei ao terceirizar para uma determinada entidade privada gerir dotações orçamentárias públicas, bens públicos e utilização gratuita de mão de obra de servidores públicos em troca, apenas, do pagamento de uma taxa de administração que será cobrada pelo Poder Público, sabe-se lá a que custo para a sociedade, na verdade trará além de grande insegurança jurídica, tais como as acima mencionadas, como também poderá facilitar o uso dessas entidades como meio de barganhas para politicagens escusas tais como, apenas para exemplificar, sem a menor pretensão de esgotá-los, os imensuráveis custos sociais relacionados aos casos de corrupção do “Mensalão”, “Petrolão”, “Eletrobras” dentre outros tantos.
E é justamente baseado nesta linha de pensamento e crença que os servidores púbicos, em especial os do Instituto Nacional de Tecnologia – INT, criado há quase 100 anos por homens heroicos que usavam para nele trabalhar terno-gravata-macacão-graxa, acreditam que esse Instituto no âmbito da Administração Direta, possa, sim, ser referência de excelência em Ciência & Tecnologia & Inovação, sem a necessidade de ocorrência de mudança do sistema de Gestão Pública para privada, por considerarem que a Administração Pública Direta pode fazer isso com maestria, pautados na ética, foco, direcionamento das ações, trabalho, dedicação, hombridade, por meio das políticas de gestão pública voltadas para resultados a serem apropriados à realidade nacional, com o olhar no curto/médio/longo prazos e a busca incessante pela eficiência.
Ciência, Tecnologia e Inovação são pilares do desenvolvimento de qualquer país rumo à riqueza. Ela se apropria da inteligência das pessoas para inventar, criar novas descobertas de engenharia, construir e inovar. No mundo globalizado, não basta ser eficaz, tem-se que ser eficiente. Assim, não basta cumprir um contrato de gestão, apenas. Além do mais, setores tecnológicos nascentes ou incipientes deveriam ser protegidos até o próprio amadurecimento. De forma que proteger esse tipo de indústria, como outros países o fazem, é dever do Estado. E isso tem como consequência o salto tecnológico e econômico que o fará se desenvolver e consequentemente melhorar a qualidade de vida de toda a nação, a exemplo da China e da Coréia do Sul que rumaram à riqueza para os seus Povos.
Weber Figueiredo, professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e paraninfo de uma turma, discursou na Cerimônia sobre a reconstrução do Brasil e exibiu a importância da Ciência, da Tecnologia e, por que não, da Inovação nesse processo, utilizando uma linguagem bem acessível:
“No comércio mundial de mercadorias. Em média: 1 kg de soja custa US$ 0.10 (dez centavos de dólar), 1 kg de automóvel custa US$ 10.00, isto é, 100 vezes mais, 1 kg de aparelho eletrônico custa US$ 100.00, 1 kg de avião custa US$ 1,000.00 (10 mil quilos de soja) e 1 kg de satélite custa US$ 50,000.00. Vejam, quanto mais tecnologia agregada tem um produto maior é o seu preço, mais empregos são gerados na sua fabricação.” (grifamos)
Por fim, chamamos a atenção para o importantíssimo fato de que, atualmente, as sociedades que não conseguem dominar a tecnologia e criar inovações que agreguem e produzam melhorias para a qualidade de vida do povo que vive no país, por conseguinte também não conseguirá avançar e se desenvolver. E para que esta não seja a nossa realidade bastará somente que o Governo se disponha a catalisar, impulsionar, dirigir e executar as ações e atividades estatais na área de Ciência e Tecnologia direcionando-as aos reais interesses da sociedade, com o apoio de todos os servidores lotados nesse Instituto Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação.
O vídeo a seguir é uma expressão do que a inteligência desse País pensa sobre as OS´s e dos seus impactos caso uma Instituição quase centenária como o Instituto Nacional de Tecnologia – iNT, venha a ser transformado em OS.
É emocionante a história desse Instituto Público e Federal. Fundado lá atrás nos anos 20. ” Um senhor de Idade que gerou muito frutos, como o INMETRO e a ABNT. Um senhor de idade que vem sendo muito mal tratado” (Elizabeth da Silva Figueiredo – Servidora Concursada do INT).